16 de dezembro de 2012

Alta Fidelidade


Da série "Retrospectivas". Postado originalmente em julho de 2010 (enquanto aguardamos a decisão do mundial de clubes, daqui a pouco no Japão - Corinthians x Chelsea).

Acidentalmente me deparei hoje com uma música cujo título me chamou atenção: “Some Hearts Are Diamonds” ou “Alguns Corações São Diamantes”. Não precisa nem fazer a análise da letra da canção. Só essa frase já dá pra fazer muitas divagações a respeito de pessoas, sentimentos, relações... o que no fundo é o que importa na vida, não é mesmo? Precisamos do outro, da família, dos amigos, da sociedade, de nos vermos refletidos no próximo...

Mas não é sobre isso que pensei em escrever agora. Só citei a música porque achei ela quando estava gravando mais um dos meus CDs. Essa história de gravar coletâneas me persegue desde a época das antigas fitas cassetes. Acho melhor explicar para as novas gerações o que é uma fita cassete. Era uma caixinha que continha uma fita onde eram registradas as músicas. 30 minutos de cada lado. Sim, era necessário virar a fita, lado A e lado B, iguais aos LPs. A não ser que você possuísse um toca-fitas ou tape-deck auto-reverse. As fitas eram de cromo, mas depois começaram a surgir as de melhor qualidade como as de ferro-cromo. Não, não vou explicar o que são LPs, tape-decks, etc.

No começo íamos às lojas de disco com a nossa lista que anotávamos a partir dos programas de radio. Como elas tinham todos os LPs, cobravam para gravar, além do preço da fita. Não era uma coisa oficial, pois era ilegal, mas todas faziam isso. Quando as coisa melhoraram financeiramente para o meu lado eu comprei minha própria aparelhagem de som: Pré-Amplificador, Amplificador, Equalizador, Tape-Deck, Sintonizador, Toca-Discos... Aí comecei eu mesmo a gravar minhas seleções. Só que eu não gravava só para mim. Ao contrário, meu maior prazer era fazer seleções para amigos e amigas que assim poderiam usufruir do prazer que eu tinha em ouvir aquelas músicas. Acho que no fundo eu queria que todo mundo gostasse de música da mesma forma que eu, que tivessem o mesmo prazer.

O detalhe é que não raras vezes minhas gravações eram personalizadas: aquela seleção para aquela pessoa. Talvez um psicólogo por vias tortas eu tentava descobrir que músicas poderiam fazer bem para aquela pessoa naquele momento. Eu achava que essa era uma mania minha, muito rara entre as pessoas e admirada pelos amigos que recebiam as fitas, que sempre ficavam agradecidos. Só recentemente vi que não era tão rara assim. O romance parcialmente auto-biográfico do inglês Nick Hornby “Alta Fidelidade” (1995) conta a história de um sujeito que é dono de uma loja de discos e tem a mania de fazer seleções musicais. Só que ele usa critérios diferentes dos meus. Ao invés de tentar adivinhar e homenagear o outro ele divide suas seleções tematicamente: “as cinco melhores músicas para cada situação”: quando for abandonado por um amor, para ouvir em um funeral, as melhores primeiras músicas do lado A, etc.
 

Vale a pena ler esse livro que já virou filme (em 2006), peça de teatro (“A Vida é Cheia de Som e Fúria”) e musical. O sucesso se deve ao confessionário existente sobre as fraquezas e inseguranças masculinas (epa! Esse hábito meu tem a ver com alguma insegurança? Um psicólogo por favor!). Sobre esse livro o crítico Alexandre Petillo escreveu: “Está tudo lá sobre o mundo masculino: as inseguranças, as encanações sobre sexo, o medo do compromisso, às canalhices, traições e, enfim, paixões arrebatadoras. Se existe alguém, homem, fã de música pop, habitante de algum país civilizado, que não leu esse livro, enterre sua cabeça num buraco. Alta Fidelidade é de longe a obra literária mais comentada de todos os tempo no mundo pop.” Um breve resumo: “O livro narra a história do dono de uma loja de música à beira da falência que apenas vende discos em vinil. Azarado no amor e ao mesmo tempo uma enciclopédia ambulante sobre música pop, os caminhos da vida terminam por levá-lo a analisar suas escolhas e prioridades, fazendo com que alcance a maioridade.
Também o cronista Arthur Dapieve (que escreve às sextas no jornal “O Globo”) ao comentar esse livro falou que possuía a mesma mania de gravar seleções musicais. Bom saber que não estava sozinho...

Embora esteja falando no passado, conforme disse antes, isso me “persegue” até hoje. Não mais com as fitas, mas agora com os CDs. Mas infelizmente acho que no momento isso está chegando ao fim da linha. Com o advento dos arquivos em MP3 o máximo que posso fazer é transferir para o pen drive, celular ou Ipod milhares de músicas que tenho no computador. A era dos suportes musicais com cerca de 1 hora de duração está acabando.
Mas por enquanto sigo insistindo. Meu mais recente “projeto” se deve a uma coleção que apareceu no início dos anos 80 e que me lembrei agora. Eram fitas cassetes (depois saiu em CD) de uma gravadora cujo título era “On The Road: 100 Quilômetros de Música”. Explicando melhor, grava-se 60 minutos de música para ouvir viajando no carro. Provavelmente vou fazer por tema: Clássico, Jazz, Blues, MPB, Pop, Rock, New Age... Eventualmente posso misturar temas diferentes. Enfim, uma FM personalizada. Essa coleção vou fazer para mim, mas quem sabe grave algumas cópias para amigos que parecem estar cada dia mais distante, conforme o tempo vai passando. Pena...

Como curiosidade, enquanto escrevia essa linhas, ouvi algumas músicas dos seguintes discos: Rod Stewart (“The Great American Songbook”, anos 2000), Paul Desmond (“Feeling Blue”, 1969), Banda de Pau e Corda (“Redenção”, 1974), Glee (“The Music”, Vol. 2, 2010), “The Best Piano Classics Ever” (2005), Jazzamor (“Travel”, 2006), Triumvirat (“Pompei”, 1976), Beto Guedes (“Amor de Indio”, 1978), Blind Boys of Alabama (“Duets”, 2009), Elomar (“Das Barrancas do Rio Gavião”, 1973).

Bem, acho que já ocupei suficientemente vocês com minhas intervenções. Vou ficando por aqui. Como não posso ofertar a todos os meus CDs, coloco abaixo uma seleção musical escolhida no You Tube (eta mania!). Por causa do Dia Mundial do Rock eu já havia postado vídeos do estilo, então escolhi outros gêneros musicais desta vez.

P.S. em 16/12/2012:
- No texto faltou ressaltar que o título do livro é uma dupla referência: "High Fidelity" era um termo utilizado em discos e equipamentos de som - que evoluíram a partir dos anos 60 - ressaltando a "alta fidelidade" na reprodução do que havia sido gravado originalmente. É claro que o autor, maníaco por música, usou o termo para também se reportar aos seus relacionamentos amorosos relatados no livro.

“Chão de Giz” (do Zé Ramalho, aqui com Elba), escuto esta música há mais de 30 anos:


O lendário O Terço original que se reuniu para relembrar clássicos como “Criaturas da Noite” (Flavio Venturini, Sergio Hinds, Sergio Magrão, participação de Marcus Viana do Sagrado Coração da Terra).


Nunca pensei que fosse gostar disso. Mas gosto. Não é difícil explicar. Se música é sempre mensagem, não pode haver mensagem positiva mais explícita do que essa. Bela canção.


Jalan Jalan é um grupo japonês que faz música baseada nos sons das ilhas da Indonésia, principalmente Bali e Java, utilizando sobretudo um instrumento chamado gamelão (que pode ser comparado com o vibrafone e xilofone). É música calma, para relaxar, usando sons ancestrais. É para viajar para a Indonésia e para dentro de si.



De volta ao começo... Coldplay, "The Scientist".


Um comentário:

JCL disse...

Grande Marcos.
Muito boa ideia essa retrospectiva.
Acompanho o blog faz tempo mas tem muitos posts que eu não li.
Esse livro deve ser muito legal. Eu tambem da mesma forma que vc e o autor faco minhas seleçoes musicais. Agora com o pen drive, conforme a atualidade comentada por vc.
E o jogo? Torço pelo Corinthians. Tá no intervalo agora.
Show!