"No começo da noite, a agência espanhola “EFE” decidiu dar uma materinha. Citou “uma entrevista realizada por internautas e divulgada nesta quarta-feira pela revista ‘Carta Capital’”. E manchetou: “Assange diz que aceitaria asilo político no Brasil”.
Não demorou muito, e os sites começaram a reproduzir o texto. Com informações da EFE - escrita por um jornalista como eu, mas que trabalha dentro de uma redação – e o logo da EFE embaixo, endossando. O UOL economia noticiou às 19h44, o Yahoo notícias também; o Terra e a Época negócios também. Virou notícia, a entrevista, somente à noite.
A verdade é que ainda predomina, mesmo nos veículos online, o padrão de buscar respaldo em outros veículos e em fontes oficiais. É compreensível, mas não é mais condizente com a maneira como as coisas acontecem hoje em dia. Há uma pluralidade de vozes e fontes que com a internet ganham visibilidade e respaldo público – como aliás, é o próprio caso do WikiLeaks. Não tem volta."
ENTREVISTA (PARTE)
Marcelo Salles – Na sua opinião, o que é mais perigoso para a democracia: a manipulação de informações por governos ou a manipulação de informações por oligopólios de mídia?
JA - A manipulação das informações pela mídia é mais perigosa, porque quando um governo as manipula em detrimento do público e a mídia é forte, essa manipulação não se segura por muito tempo. Quando a própria mídia se afasta do seu papel crítico, não somente os governos deixam de prestar contas como os interesses ou afiliações perniciosas da mídia e de seus donos permitem abusos por parte dos governos. O exemplo mais claro disso foi a Guerra do Iraque em 2003, alavancada pela grande mídia dos Estados Unidos.
Vários internautas – Em declarações ao Estado de São Paulo, você disse que pretendia usar o Brasil como uma das bases de atuação do WikiLeaks. Quais os planos futuros? Se o governo brasileiro te oferecesse asilo político, você aceitaria?
JA - Eu ficaria, é claro, lisonjeado se o Brasil oferecesse ao meu pessoal e a mim asilo político. Nós temos grande apoio do público brasileiro. Com base nisso e na característica independente do Brasil em relação a outros países, decidimos expandir nossa presença no país. Infelizmente eu, no momento, estou sob prisão domiciliar no inverno frio de Norfolk, na Inglaterra, e não posso me mudar para o belo e quente Brasil.
Vários internautas – Você teme pela sua vida? Há algum mecanismo de proteção especial para você? Caso venha a ser assassinado, o que vai acontecer com o WikiLeaks?
JA - Nós estamos determinados a continuar a despeito das muitas ameaças que sofremos. Acreditamos profundamente na nossa missão e não nos intimidamos nem vamos nos intimidar pelas forças que estão contra nós.
Minha maior proteção é a ineficácia das ações contra mim. Por exemplo, quando eu estava recentemente na prisão por cerca de dez dias, as publicações de documentos continuaram.
Além disso, nós também distribuímos cópias do material que ainda não foi publicado por todo o mundo, então não é possível impedir as futuras publicações do WikiLeaks atacando o nosso pessoal.
Helena Vieira - Na sua opinião, qual a principal revelação do Cablegate? A sua visão de mundo, suas opiniões sobre nossa atual realidade mudou com as informações a que você teve acesso?
JA - O Cablegate cobre quase todos os maiores acontecimentos, públicos e privados, de todos os países do mundo – então há muitas revelações importantíssimas, dependendo de onde você vive. A maioria dessas revelações ainda está por vir.
Mas, se eu tiver que escolher um só telegrama, entre os poucos que eu li até agora – tendo em mente que são 250 mil – seria aquele que pede aos diplomatas americanos obter senhas, DNAs, números de cartões de crédito e números dos vôos de funcionários de diversas organizações – entre elas a ONU.
Esse telegrama mostra uma ordem da CIA e da Agência de Segurança Nacional aos diplomatas americanos, revelando uma zona sombria no vasto aparato secreto de obtenção de inteligência pelos EUA.
Um comentário:
Vão fazer um filme com a história dele (se deixarem). Espero que não seja tendencioso.
Ótima entrevista!
Seria legal se ele viesse morar no Brasil como refugiado político.
Os EUA não iam gostar.
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