22 de agosto de 2012

A morte de Scott McKenzie e a canção símbolo de "Paz e Amor"

Na segunda-feira passada, ao postar aqui no blog sobre uma comunidade grega de jovens 'empurrados' para um tipo de convivência por conta da crise econômica (vejam mais abaixo), cheguei a lembrar da contracultura.
Talvez os (possíveis) leitores mais jovens não conheçam bem o significado deste termo tão utilizado em fins dos anos 1960 e início da década de 1970.
Em resumo e utilizando a Wikipedia para facilitar o uso do meu tempo (e de vocês também) uma definição poderia ser: (...)  "a contracultura era focada principalmente nas transformações da consciência, dos valores e do comportamento; na busca de outros espaços e novos canais de expressão para o indivíduo e pequenas realidades do cotidiano, embora o movimento Hippie, que representa esse auge, almejasse a transformação da sociedade como um todo, através da tomada de consciência, da mudança de atitude e do protesto político".
E ainda: "A contracultura pode ser definida como um ideário altercador que questiona valores centrais vigentes e instituídos na cultura ocidental. Justamente por causa disso, são pessoas que costumam se excluir socialmente e algumas que se negam a se adaptarem às visões aceitas pelo mundo."
Não sei se uma quarta-feira, meio de semana, todos trabalhando, estudando, envolvidos com seus afazeres domésticos e familiares, é um momento adequado para ficar filosofando sobre a importância da contracultura mas nem vou fazer isso. Só entrei no assunto porque soube hoje (só agora) que o cantor e compositor americano Scott McKenzie morreu em 18 de agosto último aos 73 anos em Los Angeles, EUA.
Não vi isso comentado pela imprensa (pelo menos por aqui). Ou estou lendo menos jornais e vendo pouca TV ou a verdade é que os meios de comunicação não deram nenhuma importância a isso (mais provável).
O que reforça a tese de que a memória de tudo e de todos, dos fatos, se esvai cada vez em menos tempo. Tem um filósofo radical (não lembro o nome) que diz que no futuro a durabilidade da memória coletiva vai durar no máximo 15 anos. É bom nos acostumarmos com a idéia de que - mesmo se fizermos alguma coisa a ser lembrada - depois de 15 anos que partirmos ninguém vai se lembrar de nós.
Mas Scott McKenzie teve seus "15 minutos de fama" que valeram décadas para muitos porque uma música composta por John Phillips do grupo Mamas and Papas e seu colega do antigo grupo The Journeymen lhe entregou a canção "San Francisco (Be Sure to Wear Some Flowers in Your Hair)". Naquele ano de 1967 a cidade da costa oeste americana São Francisco era o 'point' dos jovens que buscavam novos caminhos para a sociedade. Dali (através da música) as idéias se espalharam pelo mundo e foram reverberadas no ano de 1968.
Palavras de Scott: “Quando a música 'San Francisco' foi lançada na primavera de 1967, meu país vivia um caos. Além de sofrermos por assassinatos políticos, estávamos amargamente divididos pela escalada da Guerra do Vietnã e sangrando por atos internos de violência e ódio, muitos deles como reação a pacíficos protestos e demonstrações pelos direitos civis. Mesmo quando tantos de nós já havíamos perdido as esperanças, quando o Verão do Amor já estava se transformando num Inverno de Desespero, nossa música nos ajudou a manter-nos vivos e nos levar em frente num mundo que ainda tínhamos esperança de mudar. E ela ainda faz isso hoje."
A canção foi o hino da contracultura com sua letra simples e melodia agradável. Um retrato da geração "Flower Power" - "Love and Peace" - "Paz & Amor" que permanecerá para sempre na memória dos que ainda estão por aqui, para além dos 15 anos previstos.
Scott McKenzie logo depois abandonou a carreira musical, retornando eventualmente aos palcos para cantar sobre as flores a serem colocadas nos nossos cabelos.
R.I.P.

Em complemento, para entender melhor a contracultura:  "O discurso crítico que o movimento estudantil internacional elaborou ao longo dos anos 60 visava não apenas as contradições da sociedade capitalista, mas também aquelas de uma sociedade industrial capitalista, tecnocrática, nas suas manifestações mais simples e corriqueiras. Neste período a contracultura teve seu lugar de importância, não apenas pelo poder de mobilização, mas principalmente, pela natureza de idéias que colocou em circulação, pelo modo como as veiculou e pelo espaço de intervenção crítica que abriu.
Por contracultura, segundo Pereira, pode-se entender duas representações até certo ponto diferentes, ainda que muito ligadas entre si: Finalmente esta ruptura ideológica do establishment, a que se se convencionou chamar de contracultura, modificou inexoravelmente o modo de vida ocidental, seja na esfera social, com a gênese do Movimento pelos Direitos Civis; no âmbito musical, com o surgimento de gêneros musicais e organização de festivais; e na área política, como os infindos protestos desencadeados pela beligerância ianque. Pode-se citar ainda o movimento estudantil Maio de 68, ocorrido na França, além da Primavera de Praga, sucedida na Tchecoslováquia no mesmo ano. Pereira (1992) assevera que é difícil negar que a contracultura seja a última – pelo menos até agora - grande utopia radical de transformação social que se originou no Ocidente
."
Símbolo
O símbolo da paz foi criado na Inglaterra nos anos 1950 para uma campanha pelo desarmamento nuclear, na época da guerra fria (são as letras N e D, na linguagem marítima e aérea das bandeiras e significa "Nuclear Disarmament"). Foi adotado pelo movimento da contracultura que era contra as guerras nos anos 1960.
Os Hippies (uma vertente da contracultura mas não confundam com os atuais vendedores de bijouterias) defendiam um amor mais livre e sobretudo a não-violência, sintetizado pelo lema "Paz e Amor" além da denúncia das estratégias capitalistas e comportamento materialista (já naquela época). 
Tendo como base os direitos civis, tinham como referência as idéias de igualdade e antimilitarismo nos modelos de luta pacífica de ícones como Gandhi e Martin Luther King.
E lá se vão 40 anos.
Em um ano de eleições no Brasil (reparem a história de muitos candidatos) e em uma época de tantos conflitos, crises pessoais e internacionais, não me parece que as coisas melhoraram no decorrer deste tempo todo. Pelo contrário.
A civilização continua precisando de uma análise. No mínimo.

San Francisco (Be Sure to Wear Flowers in Your Hair)
Se você está indo para São Francisco
Certifique-se de usar algumas flores em seu cabelo
Se você está indo para São Francisco
Você encontrará algumas pessoas gentis lá

Para aqueles que vêm a São Francisco
O verão será repleto de amor
Nas ruas de São Francisco
Pessoas gentis com flores em seus cabelos

Por toda a nação, como uma estranha vibração
Pessoas em movimento
Há toda uma geração com uma nova explicação
As pessoas em movimento, as pessoas em movimento

Para aqueles que vêm a São Francisco
Certifique-se de usar algumas flores em seu cabelo
Se você vier a São Francisco
O verão será repleto de amor

Se você vier a São Francisco
O verão será repleto de amor

2 comentários:

Marcos Oliveira disse...

Em complemento:
O esquecimento é marca do presente. Mas e o pensar no futuro?
Rouanet, autor de “Mal estar na modernidade”: "Quanto ao futuro, ele era um tema fundamental durante a vigência da doutrina do progresso linear da humanidade. O futuro era o horizonte para o qual tendia o gênero humano. Era a fase das grandes narrativas, na terminologia de Lyotard, como a narrativa da revolução mundial, ou a do saber enciclopédico. Como todas as narrativas, elas tinham um começo, um meio e um fim, e o fim (não necessariamente no sentido de final) era o futuro. Mas o futuro está bloqueado por um sistema social em que o novo aparece sob a forma do sempre igual, e o sempre igual sob a forma do novo. É o tempo do inferno, para citar Benjamin.

Tudo muda: os smartphones de 2012 são diferentes dos de 2011, e isso é essencial para que nada mude. No fundo, o futuro tornou-se um termo técnico da Bolsa. As pessoas não especulam mais sobre o futuro, e sim no futuro — no mercado de futuros. A consequência mais grave da crise do futuro é que ela resultou no assassinato da utopia. E para autores sérios como Ernst Bloch, Theodor Adorno, Herbert Marcuse e Jürgen Habermas, toda sociedade e todo pensamento que não se deixem guiar pela perspectiva do futuro utópico estão condenados à irrelevância."

Alice in Wonderland disse...

Muito muito bom o seu artigo, Marcos. Parabéns!
Adoro essa música e não sabia que o cantor dela tinha morrido.