8 de maio de 2014

Vai pra puta que te pariu!



Caro senador Aloysio: não perca a cabeça; e os riscos do “vá pra puta que te pariu”

Lembre-se, caro senador, que esse clima de “pega pra capar” costuma começar com Robespierre cortando cabeças. E depois a cabeça de Robespierre também vai pra guilhotina. Com todo o respeito, não perca a cabeça.

por Rodrigo Vianna
"Caro senador, essa “carta” é escrita sem rancor nem ironia. O senhor provavelmente nem me conhece. Escrevo depois de vê-lo agredir verbalmente um blogueiro que tentou entrevistá-lo na última terça-feira, no Congresso. O senhor xingou o rapaz, avançou contra ele, e depois tentou se justificar nas redes sociais, dizendo que ele era um “ex-assessor do PT”. Aqui um tweet do @Aloysio_Nunes: “acha que um senador de oposição pode ser ofendido por um ex-assessor do PT ? Acha que não há câmeras no Senado?”

A mídia ligada ao tucanato rapidamente espalhou a notícia (falsa) de que um senador reagira a “insultos” de um blogueiro ligado ao PT. O nome do blogueiro é Rodrigo Pilha. As imagens, senador, não mostram insultos por parte do blogueiro. Mas um tratamento até respeitoso – apesar de provocativo.

Parece-me que o PSDB está mal acostumado: protegido pela mídia paulista e mineira, tem queixo de vidro. Não sabe apanhar, perdeu a capacidade de levar uns golpes. Já quer partir pra briga, pedir cabeças, mandar prender. Lamentável.

Senador, preciso dizer que eu costumava ter certo respeito pelo senhor, pela sua história. Respeito, justamente, pela firmeza que o senhor demonstrou nos momentos em que seu partido esteve na defensiva no segundo governo Lula. Enquanto Serra e Alckmin “esconderam” FHC, e renegaram o privatismo, o senhor fez campanha ao Senado com FHC no horário eleitoral em 2010. Defendeu FHC, e foi apoiado por ele. Gosto de gente que atua assim, de peito aberto. Mesmo carregando um fardo pesado.

Além disso, quando era Chefe da Casa Civil de Serra no governo paulista, o senhor alocou recursos para publicar livro importante, sobre desaparecidos políticos – editado por famílias de gente que morreu lutando contra a ditadura.

Muita gente não sabe que o senador Aloysio foi um dia o “camarada Mateus” – guerrilheiro da ALN. Atuou ao lado de Marighella, deu tiros, assaltou. Jamais renegou esse passado. E nem teria porque fazê-lo: lutava contra uma ditadura. O senhor foi mais prestativo do que certos petistas no momento em que famílias de desaparecidos e mortos pela ditadura precisaram de ajuda. De novo, postura corajosa, na medida em que contraria posições de eleitores e da base social tucana em São Paulo – que se deslocou para a direita.

Pois bem. Ao avançar contra o blogueiro no Congresso, o senhor não mostrou coragem. Ao contrário, confundiu bravura com desrespeito e autoritarismo. Foi covarde, até.

Mais que isso: o senhor justificou o ataque ao blogueiro pelo fato de ele ser do PT. Não esperava que o senhor aderisse à lógica justiceira que já incendeia as ruas e a internet. Há um movimento, um desejo latente em certos setores, de “exterminar o PT”. E ele gera um clima violento de parte a parte. “Tucanalha” de um lado. “Petralha” do outro. Onde isso vai nos levar, senador?

De fato, a abordagem do blogueiro Pilha pode ter irritado o senhor. Mas já imaginou se Genoíno ou Dirceu reagissem da mesma forma, quando foram abordados de forma muito mais agressiva por equipe de TV? Imagine se um parlamentar do PT avançasse sobre um jornalista ou humorista, gritando e xingando como o senhor fez? Estaria sujeito a pedido de cassação, por quebra de decoro. Viraria manchete. Sabemos que a mídia tucana não fará isso com o senhor. Mesmo assim, sua imagem (perseguindo aos berros o blogueiro) percorre a internet; e  não é das mais edificantes.

Imagine se o ex-presidente Lula fizesse o mesmo com certos blogueiros da “Veja” que o atacam de forma muito mais virulenta todos os dias? O Lula teria que dar uns sopapos na turma da “Veja”? Mandar a “PQP”? Esfolar? Prender?

Caro senador Aloysio, o senhor errou.

Perder a cabeça é algo normal. Quem sou eu pra dar lição de moral nesse sentido… Quem me conhece sabe que eu também brigo, não aceito desaforo. Então, senador, o mais grave não foi perder a cabeça. Mas tentar justificar o ataque porque afinal, do outro lado, estava um petista.

Senador, isso parece aquela turma que lamenta o linchamento da moça no Guarujá, porque afinal “ela não fez nada”, “não era a pessoa certa”. Ah, se tivesse feito, então podia linchar?

Esse clima de “linchamento”, de “criminalização” política, afeta hoje mais gravemente o PT. Até porque o bombardeio midiático é desproporcionalmente mais intenso quando há um petista envolvido em denúncias. Mas essa história de “vai pra puta que te pariu, seu petista”, pode virar fácil “morte aos tucanos que acabaram com a água de São Paulo”.

Senador, o senhor deveria pedir desculpas ao rapaz. Isso não o diminuiria em nada. Não significaria ceder em um milímetro nos duros embates com o PT. Legítimos, apesar de quase sempre eu estar do outro lado – e não ao seu lado nesses embates.

A sua história, apesar do PSDB ter ido para a direita, não merecia esse momento Toninho Malvadeza. O senhor é melhor que isso. Apesar de todas nossas discordâncias, sei que é.

E acho que o senhor faria bem se respondesse às perguntas que o blogueiro tentou fazer ao ser interrompido pelo “vai pra puta que te pariu”:

- por que o PSDB quer CPI em Brasília, mas não admite CPI em São Paulo para apurar as denúncias graves de “corrupa” no Metrô e nos trens?

- se o senhor acha que não precisa de CPI em São Paulo porque afinal já há outras instâncias (MP, policia etc) a investigar, por que diabos esse raciocínio não vale para a Petrobrás?

- e o que o senhor acha do envolvimento de seu nome nas denúncias em São Paulo? O senhor não deve? Então explique, sem gritar – por favor.

Lembre-se, caro senador, que esse clima de “pega pra capar” costuma começar com Robespierre cortando cabeças. E depois a cabeça de Robespierre também vai pra guilhotina.

Com todo o respeito, não perca a cabeça."

Fonte: Escrevinhador

3 comentários:

Anônimo disse...

Se fosse do PT estava nas primeira páginas dos jornais de hoje e chamada principal do JN!

DCM disse...

Não é difícil entender a personalidade histriônica, iconoclasta e combativa do blogueiro Rodrigo Pilha, militante petista.

Pilha vem fazendo o que quase todo petista gostaria de fazer mas não faz por motivos de prudência, cautela ou, simplesmente, medo.

De uma forma geral, o PT se acostumou a apanhar calado desde o Mensalão. Se foi um erro histórico, ou um acerto primoroso, o tempo dirá.

Para jovens idealistas com pouco a perder como Pilha, não reagir é uma provação. Imagine você, jovem, ver, sistematicamente, seu pai ou avô serem insultados.

As duas ações que projetaram Pilha ao centro do noticiário parecem se encaixar neste perfil psicológico.

Que petista não gostaria de dizer certas coisas a Joaquim Barbosa, como Pilha fez numa noite recente em Brasília?

Mas quantos têm a bravura, ou a irresponsabilidade, necessária para fazer o que ele fez? Barbosa teve que dormir com aquelas palavras escarnecedoras, e foi obrigado depois a vê-las reproduzidas nacionalmente na mídia.

Da mesma forma, Pilha realizou a fantasia de muitos petistas ao se acercar do senador Aloysio Nunes e lhe fazer perguntas que repórter nenhum na mídia domesticada ousa fazer.

A primeira e essencial: se Nunes vê tantas virtudes em CPI, por que seu partido sistematicamente as bloqueia em São Paulo, na Assembleia Legislativa?

Depois, Pilha perguntou a Nunes sobre sua alegada participação no escândalo das propinas do metrô.

O senador não foi nada estoico. Mandou Pilha para a puta que o pariu. Provavelmente não imaginasse que o vídeo precário que Pilha estava fazendo seria publicado e ganharia ampla repercussão.

A Era Digital tem dessas coisas.

Os desdobramentos do caso são igualmente fascinantes quanto o caso em si.

O senador alegou – numa versão comprada integralmente pela Folha – que o vídeo postado por Pilha fora editado para não mostrar uma garrafa de água que lhe teria sido atirada.

Mais uma vez, a internet mostrou que as coisas hoje são diferentes.

Pilha postou um vídeo em seu Facebook em que a aparece a tal garrafa da água. Mas não da maneira como Nunes e a Folha disseram.

Claramente, a garrafa é jogada no chão, lentamente, teatralmente. Pilha usa a garrafa para se referir à falta de água em São Paulo.

Mas o senador, com o apoio da Folha, viu ali uma agressão.

DCM disse...

Foi uma coisa tão despropositada, como se viu num segundo vídeo postado por Pilha, que logo surgiu a associação com a bolinha de papel que vitimou, aspas, Serra na campanha de 2010.

Em vez da chancela da Folha, daquela vez o apoio ao atentado da bolinha de papel foi dado pela Globo, numa memorável reportagem no Jornal Nacional em que um especialista provava – pausa para rir, de novo – o atentado petista contra Serra.

Pilha é, de alguma forma, uma resposta ao padrão conciliador estabelecido por Lula no começo de seu mandato em duas ocasiões.

A primeira foi quando assinou uma Carta aos Brasileiros nas qual se comprometia, em resumo, a não se esquerda.

A segunda foi quando ele compareceu ao funeral do homem que fez tudo para destruí-lo, Roberto Marinho.

O PT demonstrou, então, que não seguiria o caminho de outras administrações de esquerda, como a de Chávez na Venezuela e, mais recentemente, a de Correa no Equador. Ou mesmo a de Cristina Kirchner, na Argentina.

A conciliação de Lula foi, desde o princípio, encarada como fraqueza. Na mesma medida em que o PT tirou o pé do acelerador, a mídia – que é a voz da oposição – acelerou, e a Veja é apenas o caso mais extremo no abandono do jornalismo por motivações políticas.

Como a história verá tudo isso?

Caso Dilma perca – uma possibilidade remota, mas que não pode ser ignorada –, o PT verá que deixou de promover mudanças essenciais para as quais teve doze anos de poder.

Um exemplo disso é uma lei que determine limites para a mídia, algo que toda sociedade desenvolvida tem. Outro é uma máquina de verbas oficiais que alimentam pouquíssimas empresas e tornam bilionários seus donos – que se batem pela manutenção de privilégios que levaram o Brasil a ser um dos campeões mundiais de desigualdade social.

Caso Aécio se eleja, esqueça uma Lei de Mídia, ou alguma mudança na distribuição de verbas que no final patrocinam Jabor, Sheherazade, Datena, Azevedo etc etc.

Pilha é talvez um novo PT, mais aguerrido – mas que pode ter chegado tarde demais para verdadeiramente mudar as coisas.

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/qual-e-a-de-rodrigo-pilha/