22 de maio de 2015

A Paixão Política ou A Paixão Romântica?

Ultimamente os posts aqui tem rareado, mas é bom frisar que não desistimos.
Olhando os últimos que colocamos percebemos que em sua maioria são de questões políticas.
É que é difícil, com a nossa história, não tomar partido sobre alguns temas que nos saltam aos olhos, mas que são mostrados pela mídia de uma forma enviesada no sentido de defender seus próprios interesses.
Interesses que estão sempre ligados à retomada do poder pela direita, pelos reacionários de plantão. Não, não dá para chamar esse pessoal de "conservadores".
De nossa parte existe uma preocupação muito grande é com o retrocesso social. Agora que conseguimos tirar o Brasil do vergonhoso "mapa da fome" da ONU, que começamos a resgatar a imensa dívida social, estamos arriscados a ver tudo se perder. Daí a dificuldade em ficar calado.
Mas... 'para não dizer que não falamos de flores' e assuntos afins, retomamos a veia multidisciplinar do blog através de uma interessante crônica do escritor cubano Fabio Hernandez.
Ele publica seus escritos no ótimo Diário do Centro do Mundo e foi de lá que tiramos essa análise sobre as paixões masculinas.
Seu estilo é coloquial, agradável e ele costuma acertar nos pontos nevrálgicos que escolhe para tentar desvendar.
Lendo-o, me deu vontade de definitivamente abandonar os temas políticos e mergulhar nessa temática que me agrada muito mais. Acontece que tem aquela história de nossa preocupação com aqueles que são menos agraciados com uma vida digna. Por isso o obrigatório caminho à esquerda.
Mas sigamos em frente com o texto apaixonado do Fabio.
Vale a leitura para começar bem o fim de semana.
Ou não. Se você estiver vivenciando o que ele tenta traduzir...


Uma paixão está rondando você? Chute!
"Poucas coisas são mais cultuadas que a paixão romântica. É bonito, dizem, estar apaixonado. Você volta a ser um adolescente sonhador, iconoclasta, mesmo que já tenha passado dos 30 ou mesmo dos 40. Você retoma a criatividade embolorada. É capaz até de mandar flores e, mais ainda, de escrever versos lindamente medíocres. Você se olha com renovado interesse no espelho. Capricha no penteado depois de anos de desleixo. Refaz o guarda-roupa. Considera até a possibilidade de se depilar para ficar na moda ou parecer mais atraente para ela.

Viagra, talvez, para não correr riscos de mau desempenho.

Alguns pensam até na hipótese de aprender a tocar violão para impressioná-la com um dedilhado que será inevitavelmente tosco. E todos com certeza cantam alto em seu carro as músicas adocicadas prediletas que colocam para ouvir e se inspirar neste momento mágico de deslumbramento.

A paixão é linda, é o que dizem. E é também horrível. Uma das aberturas de romance mais aclamadas da história da literatura diz o seguinte: “Era o melhor dos tempos, e também o pior”. O autor é Dickens.

O mesmo se aplica para a paixão. Ela nos eleva e nos rebaixa ao mesmo tempo. Vou ser direto: a paixão nos faz burros, ridículos, irresponsáveis. O mais complicado é que ela faz tudo isso e além do mais nos engana: temos a convicção de que ela nos torna o oposto. Charmosos, quase irresistíveis.

O apaixonado é um sofredor. Ele não dorme. Ele come mal. Se ela telefona, ele tem uma crise de euforia. Se o telefone emudece obstinadamente, é motivo de aguda depressão. Se ela corresponde, ele é o rei do mundo. Se não, ele pensa alternadamente em matar ou morrer. Às vezes, nas duas alternativas. Ou numa terceira, se ela estiver interessada em outro cara.

Nenhum apaixonado de verdade escapa da gastrite. A gastrite é a prova definitiva do amor verdadeiro. E não qualquer gastrite, mas aquela que leite nenhum ameniza ou cura. Porque o problema está na mente insana, e não no estômago castigado.

Os filósofos discordam uns dos outros em quase tudo. Montaigne disse que não há nada que alguém diga, nem o seu contrário, que não tenha sido defendido por algum pensador. Um dos raros pontos em que os sábios concordam é exatamente na paixão: se você conseguir se livrar dela, se você for forte e perseverante o suficiente para dominá-la, você vai ser um cara feliz.

Não será escravo de antidepressivos e de calmantes. Não vai acordar seus amigos e amigas durante a madrugada para desabafos intermináveis. Nem se deixará entrar no egocentrismo insuportável do apaixonado, para quem a vida se resume a ela e ela. O resto, dane-se.

A paixão fecha nossos ouvidos. Só falamos. Não conseguimos escutar nada e ninguém fora dos limites do nosso amor. Tente conversar com um apaixonado. Ele não vai registrar nada do que ouvir. Ele não vai derramar uma mísera lágrima pela história mais triste que você lhe contar.

Uma paixão está rondando você? Chute.

E trocará uma eternidade de angústia por um minuto de desalento. Mas — como Montaigne escreveu – eu poderia estar aqui defendendo o contrário, com a mesma convicção."

Em complemento: achei que essa crônica do Fabio Hernandez merecia uma bela trilha sonora. Mas o que escolher entre milhares do meu repertório?
Me veio à mente então essa belíssima música instrumental do nosso querido Carlos Santana.
É do álbum duplo "Moonflower", que contém parte de material inédito registrado em estúdio e parte gravado ao vivo.
Foi lançado em 1977 e a escolhida é a faixa-título, cujo nome original é "Flor d'Luna".
Uma faixa emocionante que cai bem qualquer que seja o seu estado de espírito. O Santana tem essa capacidade de percepção nas coisas que cria. É uma alma elevada.
Alegre e triste. Extrovertida e intimista. Dançante e contemplativa. Apaixonante. Tudo ao mesmo tempo.
Além do belíssimo visual do vídeo: lua, flores e mulheres, com singeleza.
  

14 de maio de 2015

Vídeo: Advogados acusam Moro de conduzir um processo ilegal

O Cafezinho: Em vídeo bomba, advogados enfrentam Moro em audiência da Lava Jato e o acusam de conduzir um processo ilegal
De O Cafezinho, via GGN
Uma leitora amiga me manda um vídeo impressionante, que traz os advogados de Fernando Soares, um dos réus da Lava Jato, protestando veementemente contra as artimanhas do Ministério Público e do juiz Sergio Moro para enganar a defesa e manipular o processo.
A cena do vídeo é uma sala da 2ª Vara Federal de Curitiba, e os personagens principais são Sergio Moro, dois advogados de defesa, e um procurador que não aparece no vídeo.
Em determinado momento, um dos procuradores ofende o advogado, falando em chicana. Joaquim Barbosa, realmente, fez escola.
O advogado, porém, responde à altura.
São dois advogados. O segundo a falar é Nelio Machado, um dos maiores criminalistas do país, que denuncia: nunca, diz ele, em 30 anos de profissão, testemunhei um desrespeito tão gritante à Constituição e ao direito da defesa.
Machado falou que até mesmo a Constituição do Estado Novo, de inspiração fascista, trazia garantias na lei que respeitavam a defesa dos réus, garantias estas que Sergio Moro tem agredido sistematicamente, com vistas a promover, sabe-se lá com que intenções, um circo midiático-judicial.
(Sobre Nélio Machado, ler esse post, do professor Rogério Dultra).
Talvez Moro tenha intenção de seguir o exemplo de Ayres Brito e escrever o prefácio do próximo livro de Merval Pereira, e ganhar uma sinecura de luxo no Instituto Innovare, da Globo.
Machado explica ainda ao procurador mal educado e ignorante que o Ministério Público, segundo a Constituição cidadã de 88, tem como dever auxiliar a justiça. O procurador não é um justiceiro cuja função é apenas acusar. Sua função não é ver o réu como um “inimigo” a ser esmagado a qualquer custo. Não. Sua função, assim como a do advogado, é a de defender a lei.
“Não existe hierarquia entre advogado e Ministério Público, ambos são auxiliares da lei”, ensinou Machado.
O vídeo é uma bomba.
É notório, no vídeo, que Sergio Moro não atua como magistrado, mas como um rancoroso beleguim, um verdadeiro inimigo do réu e dos advogados de defesa, imitando o estilo Joaquim Barbosa.
Emblemático que ambos, Joaquim Barbosa e Sérgio Moro, tenham ganho o prêmio Faz Diferença da Globo. Quer dizer, prêmio não. Propina. O prêmio Faz Diferença deveria ser encarado como propina e os magistrados que o recebem deveriam ser acusados de corrupção, porque é um prêmio que vale mais que dinheiro. Com esse prêmio em mãos, os magistrados podem ganhar dinheiro como celebridades políticas, fazendo palestras pagas com dinheiro público, como está fazendo, sem nenhuma vergonha, Joaquim Barbosa.
Qualquer um pode ganhar prêmio: políticos, empresários, artistas. Juiz não. Juiz não deve ganhar nenhum prêmio. O que ele faz é um dever público, uma obrigação, pela qual recebe os maiores salários e as maiores regalias oferecidas pelo contribuinte a um servidor: almoço, transporte, habitação até roupa grátis, longas férias anuais.
Por tudo isso, juízes tem de ser sérios, moderados e justos. Nunca devem se deixar levar por pressões de mídia e jamais devem se portar como acusadores ou inimigos dos réus.
A outra notícia bombástica é um regaste de uma informação publicada, ano passado, num dos blogs da Carta Capital.
O post confirma uma denúncia que já fizemos aqui, com base num depoimento de Roberto Bertholdo, advogado condenado na 2ª Vara Criminal de Curitiba, onde atua Sergio Moro.
Segundo consta em matéria da Folha de 11 de março de 2006, Bertholdo declarou que seria “condenado por um esquema montado na 2ª Vara Federal Criminal, que criou a ‘indústria da delação premiada’. Segundo ele, Youssef entregou doleiros no Brasil inteiro e se apropriou de seus clientes.”
Eu gostaria de saber: nenhum jornal jamais quis saber a validade dessa denúncia? Que indústria da delação é essa? E que história é essa de que o esquema foi montado dentro da 2ª Vara Federal Criminal, a mesma onde atuava e atua Sergio Moro?
Não vale falar que Bertholo é um condenado. Se a voz de Youssef é ouvida pela justiça, pelo ministério público e pela imprensa, porque não ouvir Bertholo?
A matéria publicada num dos blogs da Carta Capital, o blog do Serapião, confirma a denúncia de Bertholdo.
Youssef delatou os principais doleiros do país, por ocasião da “delação premiada” que lhe foi oferecida por Moro e pelos mesmos procuradores que hoje integram esta conspiração judicial em que se transformou a Lava Jato.
O doleiro vem operando, há tempos, como o personagem da série Black List, estrelada por James Spader: manipulando a delação para jogar o Estado contra seus inimigos e concorrentes, e beneficiar a si mesmo.
O “prêmio” que Youssef obteve, após suas primeiras delações, feitas em 2003, para o mesmo Sergio Moro, não foi uma mera redução de pena. Foi muito mais! Youssef tornou-se o maior doleiro do país, e ampliou suas conexões ilegais com figuras estratégicas da elite política.
É incrível que depois de ter feito isso, Youssef ainda tenha credibilidade na mídia e lhe seja oferecida novamente o privilégio da delação premiada, pelo mesmo Sergio Moro e pelos mesmos procuradores!
A indústria da delação premiada não só dá lucro como parece ser intocável! O sujeito delata seus concorrentes, conta um porção de mentiras à justiça, é solto, volta a roubar, agora na condição de maior doleiro do país, e se torna um heroi da mídia, sendo paparicado novamente por um juiz supostamente vingador e procuradores midiáticos (os mesmos da primeira delação!), e tudo porque aceita representar, com seu imenso talento para manipulação e a mentira, o papel de pivô de uma conspiração judicial.
A Lava Jato é uma repetição grotesca do que aconteceu na Ação Penal 470, e traz vários personagens repetidos, a começar por Sergio Moro, que escreveu o texto fascistoide com o qual Rosa Weber condenou Dirceu: aquele que traz uma frase que resumirá toda uma era de arbítrios midiático-judiciais: “Não tenho provas contra Dirceu, mas vou condená-lo porque a literatura assim me permite”.
Crédito do vídeo: Nilton Araújo. O original, mais longo, foi publicado no site Consultor Jurídico.

4 de maio de 2015

Ganância, metáforas culinárias e hipocrisia

Semana passada reproduzimos aqui artigo do admirável Luis Fernando Veríssimo.
Neste fim de semana lemos um outro que parecia ter uma ligação com aquele.
Assim, tomamos a liberdade de mais uma vez enriquecer este espaço com suas palavras.
Capitalismo, pecado, culinária, ganância, hipocrisia, era vitoriana... onde tudo isso se junta? Só pode ser em uma crônica do Veríssimo mesmo.

O ponto da ganância
Desde que o capitalismo e a moral burguesa nasceram, ao mesmo tempo, vivem brigando. Só conseguem viver juntos com a hipocrisia
Tudo pode ser reduzido a uma metáfora culinária. Comparamos mulheres com frutas e revoluções com omeletes e dizemos que as pessoas envelhecem como o vinho — ou ficam melhores ou azedam. E já ouvi dizerem de uma mulher que lembrava um vinho da Borgonha. Nada a ver com sabor ou personalidade, e sim com o formato da garrafa (pescoço longo e ancas largas).
O capitalismo triunfante também evoca uma questão de cozinha, a do ponto. Qual é o ponto em que a ganância humana deixa de ser um propulsor econômico e volta a ser pecado? Da Margaret Thatcher diziam que ela queria o impossível: devolver à Inglaterra os valores morais da Era Vitoriana ao mesmo tempo em que desencadeava a era do egoísmo sem remorso e declarava que sociedade não existia, só existia o indivíduo e suas fomes. Dilema antigo. Desde que o capitalismo e a moral burguesa nasceram, ao mesmo tempo, vivem brigando. Só conseguem viver juntos com a hipocrisia, que teve uma das suas apoteoses na era vitoriana invocada pela Sra. Thatcher.
No Brasil de tantos escândalos, cabe a pergunta: qual é o ponto da ganância? Quando é que a mistura desanda, o molho queima e o que era para ser um pudim vira uma vergonha? Há quem diga que o mercado sabe quando e como intervir para salvar a moral burguesa. Digo, o pudim. Claro que, para isso funcionar, é preciso confiar que todas as pessoas sejam, no fundo, social-democratas, ou capitalistas só até o ponto certo do cozimento. Ou acreditar que a ganância pode destruir a ideia de sociedade e ao mesmo tempo esperar que a ideia sobreviva nas pessoas, como uma espécie de nostálgica produção caseira.
O capital financeiro que hoje domina o mundo nasceu da usura, que era punida pela Igreja Medieval. A história da sua lenta transformação, de pecado em atividade respeitável, culminando com sua adoção pela própria Igreja, é a história da hipocrisia humana. A Inquisição mandava os usurários para a fogueira, onde... Mas é melhor parar com as metáforas culinárias, antes de começar a falar nos grelhados.
Por Luis Fernando Veríssimo