Lembro de ter lido Rachel de Queiroz em minha adolescência. Depois, nunca mais.
Com as comemorações do centenário de seu nascimento (17 de novembro de 1910), além de achar legal tantas homenagens, me lembrei de velhos tempos.
Seja por causa da escola ou por interesse mesmo, além da Rachel me 'acostumei a gostar' de José Lins do Rego, José de Alencar, Cecília Meireles, Erico Verissimo, Carlos Drumond de Andrade, Fernando Sabino, Jorge Amado, Machado de Assis, Rubem Braga, etc. Muitos bons livros.
Isso faz tempo. Há séculos não leio esse pessoal todo.
Acabei indo mais pra literatura estrangeira.
Agora percebi que preciso dar um jeito de retornar a esses velhos amigos de juventude.
Graças ao centenário da Rachel.
Que permanece jovem e atual.
Mais até do que eu, que estou com metade da idade dela...
Trecho da primeira crônica escrita por Rachel de Queiroz para a coluna “Ultima Página” na revista “O Cruzeiro”, em 01/12/1945:
"Dizem-me, também que você costuma dar sua preferência a gravuras com garotas bonitas a contos de amor, a coisas leves e sentimentais. Como, então, se isso não é mentira, conseguirei atrair o seu interesse? Pouco sei falar em coisas delicadas, em coisas amáveis. Sou uma mulher rústica,muito pegada à terra, muito perto dos bichos, dos negros, dos caboclos, das coisas elementares do chão e do céu. Se você entender de sociologia, dirá que sou uma mulher telúrica; mas não creio que entenda. E assim não resta sequer a compensação de me classificar com uma palavra bem soante.
Nasci longe e vivo aqui no Rio, mais ou menos como num exílio. Me consolo um pouco pensando que você, sendo no mínimo cem mil, anda espalhado pelo Brasil todo e há de muitas vezes estar perto de onde estou longe; e o que para mim será saudosa lembrança, é para você o pão de cada dia. Seus olhos muitas vezes ambicionarão isto que me deprime, — paisagem demais, montanha demais, panorama, panorama, panorama. Tem dia em que eu dava dez anos de vida por um pedacinho bem árido de caatinga, um riacho seco, um marmeleiral ralo, uma vereda pedregosa, sem nada de arvoredo luxuriante, nem lindos recantos de mar, nem casinhas pitorescas, sem nada deste insolente e barato cenário tropical. Vivo aqui abafada , enjoada de esplendor, gemendo sob a eterna, a humilhante sensação de que estou servindo sem querer como figurante de um filme colorido. Até me admira todo o mundo do Rio de Janeiro não ser obrigado a andar de “sarong”. Mas, cala-te boca; para que fui lembrar? Capaz de amanhã sair uma lei dando essa ordem.
Apesar entretanto de todas essas dificuldades, tenho a esperança de que nos entenderemos. Voltando à comparação dos casamentos de príncipe, o fato é que as mais das vezes davam certo. Não viu o do nosso Pedro II com a sua Teresa Cristina? Ele quase chorou de raiva quando deu de si casado com aquele rosto sem beleza, com aquela perna claudicante; porém com o tempo se acostumaram, se amaram, foram felizes, e ela ganhou o nome de Mãe dos Brasileiros. Assim há de ser conosco, que eu, se não claudico no andar, claudico na gramática e em outras artes exigentes. Mas sou uma senhora amorável, tal como a finada imperatriz, e de alma muito maternal. A política é que às vezes me azeda mas, segundo o trato feito, não discorreremos aqui de política. Em tudo o mais sempre me revelo uma alma lírica, cheia de boa vontade; eu sou triste um dia ou outro, não sou mal humorada nunca. E tenho sempre casos para contar, caos de minha terra, desta ilha onde moro; mentiras, recordações, mexericos, que talvez divirtam seus tédios."
Nasci longe e vivo aqui no Rio, mais ou menos como num exílio. Me consolo um pouco pensando que você, sendo no mínimo cem mil, anda espalhado pelo Brasil todo e há de muitas vezes estar perto de onde estou longe; e o que para mim será saudosa lembrança, é para você o pão de cada dia. Seus olhos muitas vezes ambicionarão isto que me deprime, — paisagem demais, montanha demais, panorama, panorama, panorama. Tem dia em que eu dava dez anos de vida por um pedacinho bem árido de caatinga, um riacho seco, um marmeleiral ralo, uma vereda pedregosa, sem nada de arvoredo luxuriante, nem lindos recantos de mar, nem casinhas pitorescas, sem nada deste insolente e barato cenário tropical. Vivo aqui abafada , enjoada de esplendor, gemendo sob a eterna, a humilhante sensação de que estou servindo sem querer como figurante de um filme colorido. Até me admira todo o mundo do Rio de Janeiro não ser obrigado a andar de “sarong”. Mas, cala-te boca; para que fui lembrar? Capaz de amanhã sair uma lei dando essa ordem.
Apesar entretanto de todas essas dificuldades, tenho a esperança de que nos entenderemos. Voltando à comparação dos casamentos de príncipe, o fato é que as mais das vezes davam certo. Não viu o do nosso Pedro II com a sua Teresa Cristina? Ele quase chorou de raiva quando deu de si casado com aquele rosto sem beleza, com aquela perna claudicante; porém com o tempo se acostumaram, se amaram, foram felizes, e ela ganhou o nome de Mãe dos Brasileiros. Assim há de ser conosco, que eu, se não claudico no andar, claudico na gramática e em outras artes exigentes. Mas sou uma senhora amorável, tal como a finada imperatriz, e de alma muito maternal. A política é que às vezes me azeda mas, segundo o trato feito, não discorreremos aqui de política. Em tudo o mais sempre me revelo uma alma lírica, cheia de boa vontade; eu sou triste um dia ou outro, não sou mal humorada nunca. E tenho sempre casos para contar, caos de minha terra, desta ilha onde moro; mentiras, recordações, mexericos, que talvez divirtam seus tédios."
Fragmentos do documentário "Rachel de Queiroz: um alpendre, uma rede, um açude.":
8 comentários:
Marcos, que lindo, cara!
Se talvez Rachel conhecesse a Verdade como a Verdade realmente é, não teria escritos mentirinhas e fofocas( que na verdade, eram criações dela e da mais linda maneira humana e boa de dizer... pois era contra injustiça, por ter vindo de terra nordestina injustiçada. Até hoje...)e assim poderia ter levado Brasil para os braços de Jesus ao tirar dos pescoços orgulhosos das religiões que, geralmente, oprimem. Inclusive, evangélicas, muitas delas mais trevas, pois pensando que são luz mais trevas são.
Como Rachel, amo lioberdade mas ela só vem mesmo pela Verdade.
Olha a palavrinha da verificação de palavras, Marcos:
mirrimm
Não ri de mim não... ^^
Gosto de suas reflexões pois geram outras. É isso aí.
Por que não podemos caminhar lado a lado mesmo tendo pensamentos opostos? Sonho isso no Brasil. Sonho isso.Pois são nos pensamentos opostos que crescemos.
É bom podermos pensar totalmente diferente e andarmos lado a lado podendo discorrer o que pensamos.
Freud tinha um amigo que era seu oposto, mas não deixaram de ser amigos por isso. Temos que crescer nisso no Brasil e espero que seu blogue seja o inicio disso, pois estou vivendo um outro momento de blogue.
Não devemos ter pretensão de só convivermos com quem pensa como nós. Nâo. Podemos caminhar até o fim em linhas paralelas, mas jamais se engalfinhando em nós.
É isso, amado Marcos.
Um abraço,com respeito ao seu modo de ver a vida.
Rosângela
olha a palavrinha, Marcos?
kk
euremie
Eu me ri?
Eu remi?
Eu me rio?
Pode deixar que não ficar aqui "enchendo" seu saco não, tá?
Pode deixar.
Mas se escrever algo que me instigue...
Posso vir? Devemos entrar pelas portas que nos abrem. Apesar de sua porta estar aberta, sei que tem o direito de fechar.
Não terá problema. Tudo bem.
palavrinha:
asitted
assim tende a...?
Fechou ou deixou aberta?
wireman
vire, homem! A porta? Fechando ou abrindo? hehe!
~~
^^
Ah... Rachel significa "ovelha". Eu não sou Rachel mas sou ovelha. Posso ser amiga também?
inté.
matico
"mate com" o quê? Biscoitinho de povilho? hum...
As portas estão sempre abertas para expressar a sua opinião.
Obrigado pela participação em nosso blog.
Abraço.
Não entendi nada.
Pronto! Sou boba! Chorei.É que estou splanchinizomática...
olha a palavrinha:
orlyie
Orla ali...
Amo passear na orla. E aqui é confortável, sabia?
Vamos em paralelas...
http://www.youtube.com/watch?v=NP563cylY8k
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