15 de novembro de 2010

Tendências do corpo e da alma...transgressões!

O isolamento off-shore tem destas coisas, milhas e milhas de mar e horizonte sem fim, ou você se adapta de vez ao seu mais profundo eu - oculto, falante e permanente - ou...nem sei...porque a imensidão vista daqui é algo estarrecedor e extraordinário! Constroi e re-constroi universos paralelos, particularmente nas noites mais escuras e de mar mais denso e adormecido!

Hoje eu passei o dia meio agoniado, não só por saber da internação (desde sexta) de um grande amigo e companheiro como poucos: meu sogro(74)! Sentiu dores no peito na noite de sexta... Mas também porque surgiu por aqui uma pomba; não seria uma espécie que eu saberia identificar. Sim, uma linda pomba(marrom e cinza com detalhes brancos nas asas)  - maior do que as rolinhas de nossa região e menor do que a pocacú (tupi pikasú), uma rola selvagem da mata atlântica - faminta, deve ter vindo em alguma embarcação ou perdeu-se do rumo original, mas, com certeza está muito distante de seu habitat... andava no piso do passadiço leste, a beliscar pequeninos pedaços de corrosão, a procura do que comer... Senti-me impotente, tentei uma arapuca com caixa de papelão, um punhado de arroz e uma fina corda - à moda das histórias em quadrinhos, mas não fui feliz...nem ela...muito arisca tomou vôo do ponto e perdeu-se na complexa imensidão das estruturas metálicas e 360º de mar aberto...não a ví mais, acho difícil que alcance o continente sem ajuda! 

No início da noite, ouvindo novamente o lounge da rádio californiana "Sky.fm", retomei algumas leituras, e foi no livro do Rabino Nilton Bonder - de quem já postamos por aqui -, "A Alma Imortal", que acabei encontrando no capítulo: A NECESSIDADE DE TRANSGREDIR, uma boa provocação para o momento...resolvi postar no nosso blog e dividir a provocação com vocês:

"Hoje, por exemplo, é muito comum as pessoas cumprirem sua "tarefa" de procriar e prover as condições mínimas de sobrevivência a seus descendentes e fazê-lo ainda em sua meia-idade. O que fazer quando os filhos estão crescidos e com um rumo próprio e os pais têm em torno de cinquenta anos? O que fazer com os trinta anos em média que restam, ou seja, com mais uma vida inteira por ser vivida? Muitas pessoas descobrem que sua sobrevida depende de novas tarefas. Alguns desfazem os laços de seus contratos passados, alguns conseguem renegociá-los. Mas os que não o fazem, os que não usam sua alma para recriar tarefas, diminuem suas chances de sobrevivência.

Isto é real para o indivíduo e também para a espécie humana. A capacidade de trair o compromisso com "tarefas" já cumpridas e a criação de novas "tarefas", definindo a relação da espécie com o seu meio ambiente, são renovações do direito à existência. Por isso procriamos e por isso também somos mutantes. A mutação estende nossos vistos de permanência na sociedade da vida, porque a própria vida é a possibilidade de definir tarefas a si mesmo.

As "lógicas da alma" revelam a intenção transcendente da questão espiritual. Essa transcendência diz respeito também à cultura e à moral. A rebeldia que a busca do espírito instaura faz da alma um instrumento para o rompimento com normas, padrões e paradigmas.

A tradição é a codificação de princípios que permitem ao ser humano compreender a realidade à sua volta e com isso aumentar suas chances de fazer o que é esperado dele. Entre o que se espera da espécie está sem dúvida sua preservação, mas também a execução da missão estabelecida por seu potencial. A tradição contém em si o grande conflito existencial humano, que exige negociações constantes entre esses dois pólos. Sua história é marcada por controvérsia e seu território se tornou arena para essa encarniçada disputa entre o que é o "bom" do momento e um outro "bom" potencial que só se concretizará com o abandono do primeiro.

A difícil tarefa da tradição - de ser o compromisso com o passado em meio às demandas do futuro - faz com que seja campo fértil para a traição."     

3 comentários:

Anônimo disse...

Nilton Bonder é um rabino. Muito bom o texto. Bem a fente deste tempo.
Melhoras para seu familiar e parabéns por tentar salvar a ave!

Marcos Oliveira disse...

Luiz Felipe, ótimo post.
Primeiro porque que sei bem da imensidão percebida daí.
Consigo também imaginar você tentando capturar a pomba para salvá-la, ecologista dos mais dedicados que és.
Com relação ao livro do Rabino Nilton Bonder, não é o mesmo livro adaptado para uma peça de teatro por uma atriz chamada Clarice Nisquier? Parece que existia um projeto de filme também.
Com relação ao seu sogro, estimo as melhoras. Se pudermos ajudar em alguma coisa, pode contar.
Abraços.

Luiz Felipe Muniz disse...

Sim, Marquinhos, é o mesmo livro da peça de teatro com a Clarice - quem assistiu recomenda com entusiasmo, eu não assisti - e nós em setembro já havíamos postado algo sobre ela por aqui, veja:

http://luizfelipemuniz.blogspot.com/2010/09/evolucao-e-transgressao-numa-permanente.html

Sobre o meu sogro, soube no início da noite que ele já está bem e em casa...foi um susto!