14 de junho de 2014

Quem é essa turma do vai tomar no c…

Por Renato Rovai, em seu blog:

"O Brasil é um país complexo e muito difícil de explicar, mas a sua elite não. Ela é previsível e está sempre no mesmo lugar. As elites do mundo não costumam ser muito diferentes, mas a brasileira é das piores.

Não à toa o Brasil foi o último país do planeta a acabar com a escravidão, não à toa somos um dos poucos países que só agora está vivendo um ciclo democrático de três décadas. Todos os outros nossos períodos de democracia duraram menos do que isso.

E todas as ditaduras e a escravidão longínqua que tivemos são obras da nossa elite. Que se julga o Brasil. Que se acha a dona do país. Que é altamente corrupta, mas que faz de conta que o que lhe move na política é a defesa do interesse público.

Os que xingaram Dilma na tarde de ontem de maneira patife e abjeta são os netos e bisnetos daqueles que torturam negros nas senzalas. São os filhos daqueles que apoiaram a tortura na ditadura militar. São os mesmos que há pouco fizeram de tudo para que não fosse aprovada a legislação da empregada doméstica e que nos seus almoços de domingo regados a champanhe francês e a vinho italiano sobem na mesa para gritar contra o Bolsa Família.

Essa elite que xingou Dilma daquela maneira no Itaquerão sempre envergonhou o país. E ontem só aprontou mais uma. Não foi um ponto fora da curva no processo histórico. E também não foi nada inocente.

Aécio Neves mais do que todos os outros candidatos que o PSDB já teve simboliza esse elite. É o típico bon-vivant, que nunca trabalhou na vida, que surfou até os 20 anos no Rio de Janeiro e que depois foi brincar de motocross até os 25 anos na montanhas de Minas Gerais, para só depois entrar na política e ir defender os interesses da família e de seu segmento social.

Ontem, Aécio deu uma entrevista ao Globo onde atiçava seu eleitorado a sitiar a presidenta da República. E ao mesmo tempo milhares de panfletos eram distribuídos na entrada do Itaquerão associando o PT à corrupção. Pra criar o clima do ataque à presidenta.

O mesmo Aécio que botou a polícia do Rio para invadir a casa de pessoas que ele suspeita estarem criticando-o na Internet. O mesmo Aécio que silenciou a imprensa de Minas Gerais e colocou-a de joelhos para os seus projetos pessoais.

Quem xingou Dilma não foi nem um punhado de inocentes e nem a massa ignara. Foi o pedaço do Brasil que odeia o brasileiro.

Para este pedaço do Brasil que é a cara de Aécio, tanto faz se o presidente é Dilma, Lula, José ou Maria. O que eles não aceitam e que o país não seja apenas um lugar para eles exercerem sua sanha dominadora.

E por isso que o Bolsa Família, o aumento do salário mínimo, as políticas de cotas, a legislação da empregada doméstica e alguns outros programas sociais são tão abominados por essa gente. Eles querem que o povo morra de fome. Querem que o povo vá tomar naquele lugar. O xingamento não é para a presidenta. É para o Brasil que a elegeu. Porque na democracia desses patifes, o voto deles teria que valer mais do que o do sertanejo ou da mulher que luta pela sobrevivência dela e dos filhos nas periferias das grandes cidades.

Os netos e bisnetos dos escravistas e os filhos dos que apoiaram a tortura na ditadura. É esse Brasil que nos envergonha do ponto de vista histórico que nos envergonhou ontem xingando uma presidenta legítima, uma chefe de Estado que tem atuado dentro dos limites da Constituição.

Esse Brasil precisa ser derrotado mais uma vez. Porque se o projeto petista tem seus limites e poderia ser muito melhor, o desses caras é o que há de mais asqueroso. É o vai tomar no cu."

Um comentário:

Anônimo disse...

O que Aécio e Campos ganham ao justificar as vaias e ofensas no Itaquerão?

Eduardo Campos e Aécio Neves perderam uma oportunidade dourada de exercer e estimular a civilidade em meio a um debate político eivado de ódio e intolerância.

A respeito dos xingamentos a Dilma num Itaquerão lotado de gente que daria orgulho às multidões do Coliseu, Campos poderia e deveria ter dito, entre trezentas coisas, o óbvio: isso não se faz com uma senhora.

Preferiu uma saída covarde. “Quanto às manifestações dentro do estádio, a gente sabe que há na sociedade um mau humor, uma insatisfação, que se revela nesses momentos”, afirmou. “Talvez a forma possa não ter sido a melhor de expressar esse mau humor, essa discordância, mas o fato é que vale o ditado: na vida a gente colhe o que a gente planta”.

Que diabo significa isso? Aécio apelou para o mesmo clichê: “Acho que ela colhe um pouco aquilo que plantou ao longo dos últimos anos. Alguém que governa com mau humor permanente, com enorme arrogância, sem dialogar com a sociedade brasileira, de costas para a sociedade, achando que por ter a caneta na mão tudo pode”. (Depois ele amaciou um pouco no Facebook)

É uma forma de dizer que a adversária mereceu. De certa maneira, o que eles estão informando é que, se estivessem na Arena Corinthians, provavelmente estariam berrando, ao lado da colunista social do Estadão: “Ei, Dilma, vai tomar no c…”. (Marina não se manifestou — ou, se o fez, ninguém entendeu nada, como sempre).

Aécio, em especial, sabe o que é uma vaia devastadora de um estádio e seus efeitos. Em 2008, num amistoso entre Brasil e Argentina, um Mineirão tomado começou a noite entoando “Adeus, Dunga! Adeus, Dunga”. Nas cadeiras mais caras, uma plateia formada por, entre outros, Pelé, Marco Aurélio Mello e José Alencar ainda ouviu: “Ô Maradona, vai se fo…, o Aécio cheira mais do que você”.

Esse coro não saiu nos jornais há seis anos, mas pode ser ouvido até hoje. Eduardo Campos e Aécio Neves estavam, em espírito, no meio da massa cheirosa que se reuniu no dia 12 de junho de 2014 para agir como ignóbeis. Achar que é possível tirar proveito eleitoral disso é terrivelmente tacanho.

KIKO NOGUEIRA