19 de junho de 2013

Ninguém tá entendendo nada

É difícil não gostar dos textos do escritor, jornalista, dramaturgo, cronista, etc., Mário Prata.
Inteligente, utiliza de ironia, irreverência e humor para tratar de qualquer assunto.
Como é o caso dessa (tentativa de) análise das passeatas do movimento passe livre (é esse mesmo o nome do movimento?).


A Passeata
"Tinha punk de moicano e playboy de mocassim. Patricinha de olho azul e rasta de olho vermelho. Tinha uns barbudos do PCO exigindo que se reestatize o que foi privatizado e engomados a la Tea Party sonhando com a privatização de todo o resto. Tinha quem realmente se estrepa com esses 20 centavos e neguinho que não rela a barriga numa catraca de ônibus desde os tempos da CMTC. (Neguinho, no caso, era eu). Tinha a esperança de que este seja um momento importante na história do país e a suspeita de que talvez o gás da indignação, nas próximas semanas, vá para o vinagre.
Sejamos francos, companheiros: ninguém tá entendendo nada. Nem a imprensa nem os políticos nem os manifestantes, muito menos este que vos escreve e vem, humilde ou pretensiosamente, expor sua perplexidade e ignorância.
Anteontem, depois da passeata, assisti ao "Roda Viva" com Nina Capello e Lucas Monteiro de Oliveira, integrantes do Movimento Passe Livre. Ficou claro que, embora inteligentes e bem articulados, eles tampouco compreendem onde é que foram amarrar seus burros. "Vocês começaram com uma canoa e tão aí com uma arca de Noé", observou o coronel José Vicente. Os dois insistiram que não, o que há é um canoão, e as mais de 200 mil pessoas que saíram às ruas no Brasil, segunda-feira, lutavam por transporte público mais barato e eficiente. A posição dos ativistas de não se colocarem como os catalisadores de todas as angústias nacionais e seguirem batendo na tecla do transporte só os enobrece --mas estarão certos na percepção?
Duzentas mil pessoas de esquerda, de direita, de Nike e de coturno por causa da tarifa?
"Por que você tá aqui no protesto?", perguntou a repórter do "TV Folha" a uma garota na manifestação do dia 11: "Olha, eu não consigo imaginar uma razão para não estar aqui, na verdade", foi sua resposta. Corrupção, impunidade, a PEC 37, o aumento dos homicídios, os gastos com os estádios para a Copa, nosso IDH, a qualidade das escolas e hospitais públicos são todos excelentes motivos para que se saia às ruas e se tente melhorar o país --mas já o eram duas semanas atrás: por que não havia passeatas? Será porque a chegada do PT ao poder anestesiou os movimentos sociais, dificultando a percepção de que o Brasil vem melhorando, melhorando, melhorando e... continua péssimo? Ou será porque agora o Facebook e o Twitter facilitam a comunicação?
Se as dúvidas sobre as motivações --que brotam do solo minimamente sondável do presente-- já são grandes, o que dizer sobre o futuro do movimento? Marchará ou murchará? Caso cresça: conseguirá abaixar a tarifa? E, no longo prazo, terá alguma relevância? Mais ainda: adianta ir às ruas, fazer barulho? Ou a própria passeata extingue o impulso de revolta que a criou e voltamos todos para o mundinho idêntico de todos os dias, com a sensação apaziguadora de que "fiz a minha parte"?
Não tenho a menor ideia, estou mais confuso que o Datena diante da enquete, mas num país injusto como o nosso, em que a única certeza parecia ser a de que, aconteça o que acontecer, o Sarney estará sempre no poder, as dúvidas dos últimos dias são muitíssimo bem-vindas."

Antonio Prata é escritor. Publicou livros de contos e crônicas, entre eles "Meio Intelectual, Meio de Esquerda" (editora 34). Escreve às quartas na versão impressa de "Cotidiano".

2 comentários:

Anônimo disse...

Tá tendo protestos nas cidades do Brasil todo dia, de manhã, de tarde, de noite e de madrugada. Esse pessoal não estuda ou trabalha não? Se fosse na Espanha ou Grécia com desemprego batendo os 30% tudo bem. Mas aqui, com pleno emprego? Tem gente trabalhando muito e outros trabalhando de menos. Vou protestar por não ter tempo de protestar. Trabalho todo dia o dia todo e estudo à noite. E tem mais, dia de jogo da Copa é sagrado. Atrapalhar famílias que querem chegar no estádio é sacanagem. Bala de borracha!

Anônimo disse...

Perguntei para um manifestante: Passeata contra o que e contra quem? Como resposta obtive : contra tudo isto que está aí - corrupção, roubalheira, transporte, saúde e educação ruins etc.

Mas logo agora. O governo petista, mesmo com fortes e significativos erros de gestão, retirou dezenas de milhões da miséria, criando um mercado consumidor ( embora já meio saturado) e, apesar da mídia bater nisto, tem apresentado PIB crescente trimestre após trimestre.

Em Macaé e Rio das Ostras faltam caldeireiro, soldador, alpinista, motorista profissional, pilotos, caixa de supermercado, estoquista e até mão de obra especializada para fazer depilação!

Por que as passeatas não ocorreram quando Collor e Zélia confiscaram a grana de todos?

Ou por que não ocorreram quando FHC doou as estatais e ainda emprestou dinheiro do BNDES, dilapidando o legado da ditadura?

E quando vai acabar? E por que vai acabar? Qual é a principal reinvidicação? Se reduzir o preço da passagem acaba?

Outra coisa que me irrita é que a polícia não pode fazer nada. Não pode usar bala de borracha, spray de pimenta, porrada . Nada. Então quebrem tudo, pratiquem saques, pichem e depredem Patrimônios Históricos.

Acho até que vou convocar uma manifestação para o presidente do Botafogo pagar os salários atrasados dos jogadores. Vamos bloquear a Linha Amarela em frente ao Engenhão. Só não vamos quebrar nada.