7 de agosto de 2014

A escandalização do nada, por José Eduardo Dutra

"Nos últimos dias, tive a honra de ser citado por alguns veículos de comunicação em pretensos “furos de reportagem”.  É verdade que não de maneira lisonjeira, pois ora fui apresentado como uma espécie de office boy (sem demérito a estes) encarregado de entregar documentos aqui ou acolá, ora como um autêntico Agente 86 que participou de conspirações e reuniões clandestinas, em plena luz do dia e numa instituição como o Congresso Nacional. Ossos do ofício.

Vamos aos dados e aos fatos. É público e notório que fui Senador da República por oito anos, inclusive tendo participado de algumas CPIs. Sou agora Diretor Corporativo da Petrobras, companhia que está neste momento sob um verdadeiro cerco político e é objeto de investigação por parte de duas CPIs no Congresso Nacional.

Ora, qualquer grande corporação, pública ou privada, em qualquer país do mundo, em situação análoga, irá se preparar para, através de meios absolutamente legais, buscar os instrumentos necessários para prestar os esclarecimentos solicitados. Buscará informações importantes para defender seus pontos de vista, dará suporte aos seus executivos e, em se tratando de uma casa política como é o Congresso Nacional, buscarápossíveis aliados à sua visão e aos seus legítimos interesses.

Num cenário como esse, é óbvio que eu, pelo cargo que exerço e pela experiência anterior, seja uma das pessoas encarregadas dessa tarefa. Daí porque os “furos jornalísticos” que dão conta de encontros e reuniões com parlamentares e assessores são apenas risíveis.

Apenas a título de ilustração, e para refrescar a memória daqueles que consideram uma informação relevante dizer que eu me reuni “com a bancada do PT para discutir as investigações”: em 2009, quando eu era presidente da BR Distribuidora, me reuni com o então presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, no gabinete do Senador Aloísio Mercadante, com os então senadores do PSDB Tasso Jereissati, Arthur Virgílio e Sérgio Guerra. O assunto era exatamente a CPI da Petrobras, que estava sendo instalada no Senado naquela semana.

E o que fazem as pessoas da empresa que tem contato no Congresso, sejam diretores, assessores parlamentares etc? Fazem o que se faz em qualquer parlamento: PARLAR – conversar, argumentar, buscar convencer, dar e colher informações que atendam aos interesses da empresa e não deixem dúvida sobre a legalidade de seus procedimentos. Tudo isso, naturalmente, com absoluto respeito à autonomia, à independência e à opinião daqueles que foram mandatados pelo povo, os parlamentares.

Fazem o que fazia, também a título de ilustração, com toda a competência, a ex-deputada do PSDB do Ceará contratada como assessora do presidente da Petrobras até o início de 2003.  Ou o ex-deputado do PSDB mineiro, presidente da Transpetro, até o início de 2003. Ou ainda o ex-deputado do PSDB do Paraná, membro do Conselho de Administração da Petrobras Argentina, também até o início de 2003, cargo que acumulava com o de Diretor Geral de Itaipu Binacional.

Fazendo uma pequena digressão, claro que isso é coisa de “estatal aparelhada” e que não acontecerá caso o candidato do PSDB, Aécio Neves, chegue à Presidência da República. Sobre isso, aliás, me permitam compartilhar com vocês uma pequena curiosidade. Será que a MERITOCRACIA defendida por Aécio prevê a ocupação do cargo de diretor da Caixa Econômica Federal por um jovem de 24 anos sem nunca ter tido carteira assinada? Cartas para a redação.

Mas, voltando à vaca fria, estamos agora diante de uma “denúncia bombástica”: A fraude na CPI da Petrobras. Dirigentes da Petrobras que depuseram na CPI - na condição de testemunhas, diga-se de passagem - teriam recebido um “gabarito” com as perguntas que lhe seriam feitas, e as respectivas respostas, o que lhes teria possibilitado um bom desempenho.

Bem, a nota divulgada pela Petrobras já faz referência ao trabalho que foi desenvolvido por nossos grupos internos - a partir das perguntas iniciais apresentadas nos planos de trabalho das CPIs; das diversas audiências públicas em que os nossos dirigentes participaram, nas duas casas do Congresso, sobre os mesmos assuntos; e dos questionamentos levantados pela imprensa sobre os pontos investigados.

Gostaria de levantar apenas dois pontos que, a meu ver, desmontam a tese de fraude, desrespeito ao Congresso, ameaça à democracia, aparelhamento espúrio e outros epítetos igualmente virulentos.

Se era tudo um jogo de cartas marcadas, porque os mesmos meios de comunicação que hoje abraçam essa tese conseguiram apontar tantas contradições nos depoimentos de Graça Foster, Nestor Cerveró e Gabrielli?  Especificamente no caso Pasadena: no quão importantes eram as cláusulas put-option e Marlin; na avaliação sobre se foi um bom ou um mau negócio; na opinião de cada um sobre qual seria a decisão do Conselho caso as referidas cláusulas lhes tivessem sido apresentadas.

Esse fato, por si só, demonstra que as respostas dos executivos aos senhores senadores obedeceram à percepção de cada um sobre os detalhes do  processo. O que houve de comum entre eles - e não por combinação ou decoreba de uma resposta previamente recebida, mas por convicção - foi o entendimento de que não houve ilegalidade no negócio, e que possíveis prejuízos decorreram de mudanças nas premissas e no cenário econômico, algo a que qualquer empresa atuante num mercado competitivo, como o americano, está sujeita.

Outro ponto importante é que a tese da fraude ignora olimpicamente que Graça e Gabrielli depuseram também na CPI Mista, inquiridos pela oposição com suas perguntas argutas, incisivas e demolidoras, e nenhum dos competentes parlamentares da oposição conseguiu colher qualquer deslize dos nossos executivos ou derrubar suas respostas. É bom lembrar que, no caso do depoimento de Gabrielli, o relator abriu mão de iniciar a inquirição e deu espaço para que os parlamentares da oposição o fizessem primeiro.

Uma última consideração. Até as paredes da chapelaria do Congresso sabem que as CPIs chegam a conclusões relevantes não através das inquirições, mas dos documentos a que tem acesso. E, com relação a isso, a Petrobras vem demonstrando todo o seu respeito pelo Congresso Nacional, atendendo dentro do prazo a todas as demandas da CPI.

Estes são os fatos e dados. O resto é luta político-eleitoral, que hoje não está dentro das minhas atribuições, mas que também sei fazer."
José Eduardo Dutra (*)
Fonte: Jornal GGN / Luis Nassif Online
* Botafoguense, noveleiro e petista. Em ordem cronológica.

2 comentários:

Anônimo disse...

J. Carlos de Assis: Conluio Veja-TV Globo, máquina de criar falsos escândalos

por J. Carlos de Assis, no GGN, via Escrevinhador

Que “Veja” e Tevê Globo, por força de seu proselitismo de extrema direita, inventem um escândalo relacionado com a CPI da Petrobrás para desacreditar o Governo, nada de novo. Que os dirigentes do Senado e da dita CPI levem isso a sério, ao ponto de determinar investigações, é extremamente grave. Significa que não há um processo preliminar de avaliação de pseudo-denúncias pelo qual alguém que ostente a credencial de Senador da República acabe passando o recibo de ser um simples idiota.

Já fui secretário de CPI da Câmara dos Deputados. Era comum que fizesse uma lista de perguntas sobre questões específicas aos depoentes. Meu interesse, na condição de auxiliar da instituição CPI, era o esclarecimento de fatos e de situações de seu interesse. Jamais passaria pela minha cabeça esconder minhas perguntas. Não estava num programa de pegadinhas na televisão. Meu interesse não era forçar contradições do depoente, mas colocá-lo diante de questionamentos objetivos para trazer a verdade à tona.

Já auxiliei pessoas a prestarem depoimentos em CPI ou a participarem de debates públicos. Meu papel, nesses casos, tem sido o de simular à exaustão respostas a possíveis perguntas ou respostas a diferentes questionamentos de conhecimento público, incluindo prováveis provocações por interesses escusos. Só um idiota vai para uma inquirição pública ou debate sem alguma forma de preparação. Em geral, nossa memória é fraca. E numa situação em que há algum nível de hostilidade ideológica, todo cuidado é pouco.

O “crime” postulado por “Veja” e catapultado em nível nacional pela Globo, num conluio explícito para desacreditar o Governo, consiste na afirmação de que depoentes vinculados à Petrobrás tiveram acesso a perguntas que seriam feitas na CPI. Ora, ou essas perguntas são objetivas, visando a algum esclarecimento efetivo, ou são pegadinhas, para forçar contradição do depoente. No primeiro caso, a antecipação da pergunta, se houve, não teria qualquer efeito no esclarecimento dos fatos. Contudo, se é uma pegadinha, não tem nenhum efeito objetivo sobre o curso da CPI, exceto, talvez, a humilhação episódica do depoente.

Entretanto, essa não é propriamente a questão, mas seu contexto. O fundamental é que não se pode fazer uma investigação no Senado sobre algo que não existe. Acaso seria crime um depoente ter acesso a perguntas a que seria submetido? Acaso preparar um depoente para responder perguntas na CPI seria crime? Onde está a fraude? Preparar-se adequadamente para uma CPI honra a instituição do Congresso

Anônimo disse...

O depoente poderia simplesmente chegar lá e calar-se. Naturalmente que, para “Veja” e Tevê Globo, o espetacular, para mexer com a emoção do povo, seria que alguém, pego de surpresa, cometesse o percalço de confessar algum crime na CPI a fim de que saísse de lá com algemas. Isso, já se viu, não acontecerá na CPI da Petrobrás simplesmente porque não houve crime. Portanto, é preciso inventar algum na sua periferia.

No meu tempo de jornalismo, inaugurei no Brasil o jornalismo investigativo na área econômica denunciando vários escândalos financeiros do período da ditadura, ainda na ditadura. Era um trabalho solitário. Não havia ajuda da Polícia Federal, que na época só se preocupava em prender comunistas; não havia apoio do Ministério Público e da própria Justiça (com raríssimas exceções), serviçais do poder militar; ou do próprio conjunto da imprensa, que se mantinha omissa com medo do Governo ou do anunciante.

Não obstante, com o apoio de meu jornal, pude enfrentar grandes blocos de poder político e econômico pela razão elementar de que tinha uma premissa: na denúncia, é preciso ter um código de ética que leve em conta a solidez das provas, a clareza do crime ou da irregularidade, e a inequívoca identidade dos autores.

O código de “Veja” é diferente. Em vez de provas, basta-lhe uma gravação que algum agente desonesto da Polícia ou um espião privado lhe entreguem comprometendo, num contexto nebuloso, alguma pessoa suspeita de governismo; é totalmente dispensável identificar a ação denunciada como crime ou irregularidade; os autores podem ser difusos, desde que comprometam de alguma forma o Governo. Assim, coma gravação deturpada de um lado e o apoio da Tevê Globo do outro, “Veja” produz um escândalo com som retumbante o suficiente para que o Senado a leve a sério.

Em três livros sobre a patologia dos escândalos da era autoritária – A Chave do Tesouro, Os Mandarins da República e A Dupla Face da Corrupção -, em vez de me limitar à história dos escândalos em si, procurei mostrar a institucionalidade que permitiu sua eclosão. Vou fazer o mesmo, resumidamente, para que se entenda a patologia dos “escândalos” denunciados por Veja.

A revolução da informática expulsou os jornais da notícia; como reação, o jornalismo escrito tenta se refugiar na análise. A revista ficou com seu espaço diminuído, porque está distante da notícia (diária) e com pouca eficácia na análise, campo dividido com os jornais. Como consequência, seu campo favorito tornou-se o escândalo. Notem que, de duas em duas semanas, “Veja” expõe um, às vezes elevando roubo de galinha a categoria de grandes escândalos. Quando nem isso existe, ela inventa. Daí a “fraude” na CPI.

P.S. Para que não me interpretem equivocadamente, devo dizer que não sou governista, não sou do PT nem apoio integralmente a política do PT. Admiro as políticas sociais dos governos Lula e Dilma, mas discordo de sua política macroeconômica, que considero responsáveis pelo mau desempenho da economia brasileira. Não obstante, não saio por aí inventando escândalos para dar suporte a candidatos neoliberais de extrema direita na atual disputa eleitoral.

J. Carlos de Assis – Economista, doutor em Engenharia de Produção pela Coppe-UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB, autor de mais de 20 livros sobre economia política brasileira.