7 de novembro de 2009

A Profecia Celestina: Uma Viagem Literária e Musical

Na década de 1990, dentre boas publicações, uma se destacou por buscar uma fórmula inusitada. Trata-se do livro “A Profecia Celestina”, escrito por um pesquisador chamado James Redfield. Eu li o livro, achei muito interessante e passei a imaginar um modo de incluir uma resenha sobre ele no jornal que publiquei entre os anos de 1995 e 2000.
Acontece que o jornal era especializado em música e faltava um motivo que eu pudesse me apegar para justificar a inclusão de um comentário literário. Exatamente quando eu estava nessa busca, parecendo que vindo dos céus, caiu em minhas mãos um CD maravilhoso cujo músico tinha feito uma versão musical de um livro chamado... “The Celestine Prophecy”! Quase não acreditei.
Toda essa introdução é para informar que coloco logo a seguir aqui em nosso Blog a íntegra da matéria que fiz sobre o livro e sobre o citado disco. Resolvi fazer isso por dois motivos: o lançamento do filme “2012” (que não tem nada a ver com o livro, mas a fonte temática é a mesma: profecias dos povos pré-colombianos da América do Sul) e a reunião mundial sobre o clima que vai acontecer em dezembro em Copenhagen, na Dinamarca (COP 15). Explico: enquanto os dirigentes das nações (e não estou falando necessariamente de Presidentes e Primeiros-Ministros) não mudarem a mentalidade “lucrativa” e não evoluírem, a coisa não vai pra frente... É sobre isto que tratam as profecias descritas no livro. Vejam essa citação que coloquei na matéria: (...) Carlos Cardoso Aveline afirma que "James Redfield propõe mecanismos para o surgimento prático de uma cultura global que reformule todo o processo civilizatório a partir de um novo sentimento de amor, livre de egoísmo, que já brota do coração de cada ser humano atento à vida" (Revista Planeta, edição 284, pág. 34, maio/96).
Ao final do artigo inclui dois temas do citado disco para que vocês tenham uma noção do tipo de música desenvolvida. Essa é a vantagem da Internet. No jornal eu só comentei o livro e o CD, mas não dava para incluir trechos das músicas. Espero que gostem... Em tempo (ia me esquecendo): existe um DVD (nas locadoras) que mostra uma versão em filme desse livro. A trilha sonora é outra e o filme é bem inferior ao livro, mas pode ser uma opção para quem quiser conhecer um pouco mais da história.

James Redfield e Christopher Franke
Qualquer pessoa razoavelmente informada sobre música dos anos 70 sabe da importância de Christopher Franke. Sua entrada no TANGERINE DREAM em 1971 foi um dos elementos responsáveis pela decolagem da banda rumo a uma produção de incrível qualidade técnica e de uma criatividade acima da média. Na época, com 18 anos, ele estava vivenciando uma série de experiências musicais que começaram no Conservatório Musical de Berlim, onde estudou música clássica e composição e continuaram com a iniciação em técnicas de estúdio pelo músico suíço de vanguarda Thomas Kessler.
Essas atividades encontrariam uma base sólida no trabalho desenvolvido por ele e alguns amigos na Escola de Música Eletrônica de Berlim. Influenciado por John Cage e Karl-Heinz Stockhausen e por mestres modernos da pintura, notadamente os surrealistas Salvador Dalí e Joan Miró e pelo pai do abstracionismo, o russo Vassíli Kandinsky (das idéias desses artistas ele buscava criar uma versão musical), acabaria tendo o primeiro contato com o Rock Progressivo através do grupo AGITATION FREE (mas não chegou a gravar nada com a banda).
Apesar de tão jovem, seus conhecimentos - aliado a uma espécie de alquimia que ocorreu com a união de três ´feras´ (ele e mais os incríveis Edgar Froese e Peter Baumann) - acabaram por criar o som característico do TD, cheio de sintetizadores, sequenciadores, etc.
Permanecendo na banda por 18 anos, ele registraria os seguintes discos: Alpha Centauri (1971), Zeit (1972), Atem (1973), Green Desert (1973), Phaedra (1974), Rubicon (1975), Ricochet (ao vivo, 1975), Stratosfear (1976), Encore (ao vivo, 1977), Sorcerer (trilha sonora, 1977), Cyclone (1978), Force Majeure (1979), Tangram (1980), Exit (1981), Pergamon (1981), Thief (trilha sonora, 1981), White Eagle (1982), Logos (ao vivo, 1982), Hyperborea (1983), Risky Business (trilha sonora, 1983), Poland (ao vivo, 1984), Wavelength (trilha sonora, 1984), Firestarter (trilha sonora, 1984), Flashpoint (trilha sonora, 1984), Le Parc (1985), Heartbrakers (trilha sonora, 1985), Underwater Sunlight (1986), Legend (trilha sonora, 1986), Tyger (1987), Near Dark (trilha sonora, 1987), 3 O’Clock High (trilha sonora, 1987), Shy People (trilha sonora, 1987) e Live Miles (ao vivo, 1988).
No ano de 1976 ele criaria o seu primeiro estúdio em Berlim; muitos dos discos do TANGERINE DREAM seriam gravados ali. Em 1990, dois anos após ter se desligado da banda, criaria o seu segundo estúdio em Los Angeles, Estados Unidos, cujo objetivo principal era fazer trilhas sonoras para filmes de Holywood. Para isso fundou também a Berlin Symphonic Film Orchestra, unindo desta forma música eletrônica e acústica.
Viriam então os seguintes álbuns: Pacific Coast Highway (1991), The London Concert (ao vivo, 1992), Universal Soldier (trilha sonora, 1992), New Music For Films, Vol. 1 (coletânea com trilhas sonoras não editadas anteriormente, 1992), Klemania (1993), Raven (trilha sonora, 1994), Enchanted Nature (coletânea com alguma coisa inédita, 1995), Babylon 5 (trilha sonora, 1995), Tenchi Muyo, In Love (trilha sonora, 1996) e The Celestine Prophecy, A Musical Voyage (1996). Sobre este trabalho mais recente é que vamos falar agora.

As Profecias
Em 1993 seria editada nos Estados Unidos a primeira edição do romance The Celestine Prophecy (´A Profecia ’, Brasil, Editora Objetiva, 289 páginas, atualmente na 61a edição), do escritor James Redfield. No ano seguinte, ele se converteria no maior fenômeno de vendas dos últimos tempos. A história é bem interessante. Trata da descoberta nas selvas do Peru de um manuscrito escrito em aramaico, datado de cerca de 600 a.C. (possivelmente de autoria dos maias), que traria importantes revelações para a humanidade. O documento é dividido em nove partes, denominadas visões e a sua descoberta se dá aos poucos, realizada por cientistas, religiosos e buscadores da verdade. A narração é feita por um personagem que entra quase acidentalmente na história e através dele vamos vivendo uma série de aventuras, cheias de perigos e suspense uma vez que, embrenhado no interior peruano, ele se vê perseguido por autoridades daquele país, que incitados pela igreja - que vê no documento uma ameaça a toda estrutura montada durante séculos - planejam destruir todo e qualquer resquício do manuscrito. Mas o sucesso da obra se deve menos pelo romance de aventura e suspense e mais por suas profecias, que contém todo um mapeamento das transformações que estão começando a ocorrer nos parâmetros que regem a forma de pensar e - consequentemente as atitudes - do homem.
Sobre isto, Carlos Cardoso Aveline escreve: "James Redfield propõe mecanismos para o surgimento prático de uma cultura global que reformule todo o processo civilizatório a partir de um novo sentimento de amor, livre de egoísmo, que já brota do coração de cada ser humano atento à vida" (revista Planeta, edição 284, pág. 34, maio/96). Podemos acompanhar o desenrolar da tese através de cada uma das visões.
A primeira chama a atenção sobre os palpites, intuições e coincidências que ocorrem a todo momento em nossa vida. A idéia é que essas ocorrências são guiadas por uma força (a princípio) inexplicável, e destinam-se a transformar as nossas vidas. A consciência disso é a Primeira Visão. A Segunda Visão coloca as previsões do Manuscrito em um contexto amplo, plausível e inevitável quando vê a evolução do pensamento humano sob uma perspectiva histórica. O objetivo é compreender o que aconteceu até agora no mundo, despertando uma visão do futuro. A reconstituição dos últimos 1000 anos mostra então um homem em busca de respostas científicas para dúvidas existenciais - após ter perdido a segurança espiritual por volta do século 14 - e como não as conseguiu imediatamente, tratou de substituir a busca de respostas por uma segurança secular, econômica.
A Segunda Visão desperta a preocupação para a questão primordial: ´O que está por trás da vida neste planeta? Por que estamos aqui na verdade?´ A Terceira Visão aborda a questão da Energia que significou um retorno ao esotérico propiciado pela ciência a partir das descobertas da física quântica e do trabalho desenvolvido por Einsten, mostrando que ´o que percebemos como matéria sólida é em sua maior parte espaço vazio percorrido por um padrão de energia´. No quantum revelam-se padrões de energias cada vez menores, até as partículas mais elementares cujo simples ato de observação pode alterar o comportamento.
A idéia defendida na Terceira Visão é a possibilidade de interagirmos com todos os elementos do universo, moldando-o de acordo com nossas intenções e expectativas, ou seja, somos capazes de transmitir e captar formas energéticas que alterariam tudo ao nosso redor e até nós mesmos, pois também somos energia pura. Pelos conceitos que conhecemos de energia é normal supor que haja uma fonte maior gerando o princípio de tudo. A tese defendida no livro é que existe, só que o ser humano se desligou dela e a única porta que ficou aberta para captação de energia é a que flui entre as pessoas.
A Quarta Visão mostra que todos os conflitos humanos provém da necessidade de se roubar energia para se sentir bem: ´Nós, humanos, procuramos ser mais espertos e controlar uns aos outros não só por causa de alguma meta tangível que estejamos tentando alcançar no mundo externo, mas por causa de um estímulo psicológico que recebemos. É por isso que se vêem tantos conflitos no mundo, tanto em nível individual quanto de nações´. É a disputa pelo poder onde a dominação de uns pelos outros é a tentativa de se apoderar das mentes para roubar energia. Este roubo pode se dar em uma simples conversa, onde se tenta prevalecer uma opinião: o vencedor da discussão se energiza e o perdedor se enfraquece. O importante no atual estágio é ter a consciência disso, para que comecemos a nos livrar desta disputa e possamos então receber energia de outra fonte.
Após uma experiência mística em uma montanha o narrador é iniciado na compreensão da Quinta Visão: o universo pode nos suprir desta necessidade de energia; é o grande salto que se pode dar em uma escala evolutiva. Com isso todos os conflitos humanos, insuflados pelo ego, acabam e podemos entrar em uma outra esfera.
A Sexta Visão mostra a necessidade de nos livrarmos dos ´dramas de controle´ inconscientes criados em nossa vida familiar, durante a infância, para ´roubar´ energia: existem então o ´intimidador´, o ´interrogador´, o ´indiferente´, etc. A Sétima Visão mostra a necessidade de estar alerta aos sinais do universo e a Oitava um novo caminho na ética interpessoal: da educação dos filhos ao relacionamento com o sexo oposto. A Nona mostra o nosso destino final em uma revelação impressionante, envolvendo vibrações energéticas, transcendência, transubstanciação, travessia espiritual, de onde viemos para onde iremos, etc. Para entender do processo é indispensável ler o livro (o que nós dissemos até aqui é apenas um resumo muito deficiente) até mesmo para aproveitar melhor a música que comentamos a seguir.

Chris Franke e a Profecia Celestina
Com a proposta que o livro tem, é realmente um desafio criar uma obra musical que lhe sirva de trilha sonora e que ao mesmo tempo seja independente. Acreditamos que tenha existido uma grande cooperação entre o autor do livro e o compositor, para que se chegasse a um resultado realmente louvável. Os caminhos musicais que se abrem para o desenvolvimento de um tema como este são quase infinitos e a grande questão é achar o melhor. Com sua extensa formação Chris percebeu que ao relator os acontecimentos em um selva peruana, James Redfield quis fazer uma ponte entre sociedades ancestrais e a sociedade do futuro que ele propõe. Nada mais correto então que tomar como base a música étnica e a partir daí desenrolar a trama musical, incluindo aos poucos, elementos sinfônicos, ora com características mais acústicas, ora eletrônicas. Evitando se limitar à utilização da música folclórica apenas da região abrangida pelo romance (no caso a andina) ele faz uma interligação dos diversos conceitos estéticos (e religiosos) de vários povos ao redor da terra.
Esta tarefa grandiosa contou com o auxilio de um etnomusicólogo, o conhecido percussionista Alex Acuña. Outro convidado especial é o músico Paul Horn que comparece tocando Flauta Nativa Indígena e Flauta Chinesa. A preocupação de manter um clima puro nas composições fez com que Chris Franke convidasse uma série de músicos (com seus instrumentos originais) e cantores de diversas nações, assim temos: Sanbona e Flautas Peruanas, Flautas Japonesas, Flautas de Pan e de Bambu, Harpas Irlandesa e Celta, Metaphone, Violino Chinês, Didgeridoo, Glas Harmonium, Percussão Peruana e Africana, Vozes Tibetanas, Vozes Celtas, Vozes Africanas, Vozes dos Cânticos Guturais de Tribo Aborígene de Taiwan, etc. Além da Berlin Symphonic Film Orchestra e dos sintetizadores de Chris, é claro. O clima das músicas é sempre agradável, às vezes rítmico, às vezes contemplativo, mas com uma vivacidade que não permite que a coisa resvale para a monotonia.

Cada música conta uma parte do livro e tem uma introdução temática escrita no encarte pelo próprio James Redfield, que chega a comentar cada uma delas, como vemos por exemplo em ´Jensen - O Ladrão de Energia´: ´Quando o Narrador se encontra em Chula, um primitivo vilarejo existente em nosso mundo moderno, o som característico de uma cobra o alerta de que ele está prestes a encontrar um inimigo, um ladrão de energia conhecido como Robert Jensen. Jensen planeja descobrir a Nona Revelação e usar esta descoberta para controlar e restringir o Manuscrito. Em ´Jensen - The Energy Thief´, os tons orgiásticos de uma guitarra e os acordes de uma bass marimba mostram pessoas e lugares de ética questionável.
Um lamento vocal adverte para o perigo com que o Narrador se defronta em Chula, que é também representado por Jensen, seu morador. A advertência continua através da percussão e de guitarras ciganas, enquanto o Narrador é conduzido de volta à relativa segurança da floresta por vozes africanas´. O CD ´The Celestine Prophecy - A Musical Voyage´ foi lançado em 1996 pela Priority Records e editado no Brasil pela Virgin com o encarte traduzido. Leia o livro ao som do disco. Recomendação segura do Jornal Metamúsica.
M.C.O.




7 comentários:

Anônimo disse...

Li esse livro há muito anos. É muito bom! Gostei das músicas mostradas nos videos.

Verônica Santos disse...

Marcos e Luiz Felipe, sabem informar se os discos citados, tanto do Tangerine Dream como do Cristopher Franke são possiveis de encontrar em lojas? E o livro A Profecia Celestina ainda está em catálogo? Pesquisei na Internet e não encontrei. Existem outros livros com temas como esse? Obrigado!

Marcos Oliveira disse...

Verônica, obrigado pela presença aqui no Blog. Com relação aos CDs, não sei de que cidade você é, mas vc pode encontrá-los em uma loja no Rio de Janeiro chamada Modern Sound Mega Music Store (é uma loja muito tradicional e imensa; aliás qualquer dia vou escrever um artigo sobre esta e outras lojas de discos do Rio), que fica na Rua Barata Ribeiro, n. 502, em Copacabana (tel. 021 2548-5005). Os do Chris Franke são mais difíceis, mas eles tem lá também. Se não tiverem eles encomendam. Você pode pedir pela Internet em www.modernsound.com.br. Outra opção é mandar vir direto do exterior via www.amazon.com. Ou pode-se 'baixar' pela Internet... O livro está em catálogo pela Editora Objetiva (veja, por exemplo, em www.livrariasaraiva.com.br). Existem outros livros do gênero. O próprio James Redfield escreveria depois "A Décima Profecia" e "O Segredo de Shambhala". Acho que ele influenciou gente como Dan Brown de "O Código Da Vinci", embora os livros de Redfield busquem passar algum tipo de mensagem para evolução individual e planetária, o que não acontece com Brown.
Espero ter esclarecido suas questões. Volte sempre Verônica. Um abraço.

Roberto Shimmel disse...

Grande Marcos Cardozo! Voce ñ me conhece mas eu tenho todas as edições do Metamusica guardadas como um tesouro. Foi um amigo que me passou o link desse blog onde voce escreve. Eu sempre me perguntei por onde voce andava. O pessoal daqui de São Paulo manda perguntar quando é que o grande Metamúsica retorna!
Um grande abraço e escreva matérias inéditas sobre Rock Progressivo, daquelas que só você é capaz de fazer! OK? :)

Marcos Oliveira disse...

OK Roberto. Obrigado pelas palavras. Eu continuo por aqui, na cidade de Campos, RJ. Sobre o retorno do Metamúsica, vejo a possibilidade de retorno só daqui a alguns anos. O que não impede que eu escreva de vez em quando alguns artigos sobre o tema.
Abraços.

Unknown disse...

sempre gostei de músicas assim,que calam no fundo da alma; Amo flauta PAN OU TRANVERSA FEITA DE BAMBU e pra minha pessoa não há nada igual a isso Grato: Jonas Evandro G. Motta.sucessos!

Marcos Oliveira disse...

Você tem bom gosto Jonas Evandro. Obrigado pelo comentário.
Abraço.