27 de janeiro de 2011

O Estupro como arma e prêmio de guerra em pleno Séc. XXI, puro horror!

Eu sei que o tema não agrada a ninguém em sã consciência e mesmo fora dela.

É verdade que o Blog também tem uma atração fatal com temas mais agradáveis e atraentes ao grande público e alguns outros mais refinados, e espero que continuemos por aí.

Mas depois de pensar um pouco a respeito do assunto, do desafio que representa a inserção das mulheres na vida ativa das sociedades modernas, do quanto ainda há de pré-conceitos de gênero em toda a parte do mundo...eu resolvi então sim trazer para o Blog um texto forte, publicado nesta semana no "The Economist" (e na Carta Capital) e que me tocou profunda e inexperadamente, justo eu que não costumo me impressionar mais com tantas e tantas transformações em andamento por aí...

Acho que me pegou meio de surpresa os detalhes da narrativa, cheguei a me lembrar que estas visões eu tive quando estudei um pouco de História, as grandes guerras de conquistas, eliminações e dominações de povos do passado...e coisa e tal...

O fato é que o texto abaixo, narra o que há de mais tardio, remoto e horrendo na face da Terra hoje, sendo praticado em larga escala entre povos e nações em guerras, sob os olhares silentes do público em geral e dos líderes das grandes nações "democráticas" em particular, nos dias atuais, em plena era de internet's, facebook's, twitter's, ipad's...

Você também vai achar o texto longo, mas eu não vou expô-lo todo aqui, somente uma pequena parte, se ficar tão tocado(a) e  curioso(a), como eu fiquei, então vá no caminho que sinalizo...já lhe digo...tive dificuldades para chegar ao final do texto, tamanho o horror...quis desistir...mas não...estes são os humanos de nosso tempo!

"Vítimas ignoradas das guerras


The Economist
26 de janeiro de 2011 às 7:27h

O estupro é terrivelmente comum em conflitos em todo o mundo

Pouco depois de dar à luz o sexto filho, Mathilde foi com o bebê para os campos para fazer a colheita. Ela viu dois homens se aproximarem, usando o que parecia ser o uniforme da FDLR, uma milícia de Ruanda. Ao fugir, encontrou outro homem, que golpeou sua cabeça com uma barra de ferro, caiu ao chão com o bebê e ficou imóvel. Talvez pensando tê-la matado, o homem foi embora. Os outros dois vieram e a violentaram, depois a abandonaram como morta.

A história de Mathilde é muito comum. O estupro na guerra é tão antigo quanto a própria guerra. Após o saque de Roma, há 16 séculos, Agostinho chamou o estupro em tempo de guerra de um “mal antigo e costumeiro”. Para os soldados, há muito tem sido um espólio de guerra. Antony Beevor, historiador que escreveu sobre estupros durante a ocupação soviética da Alemanha, em 1945, diz que a violação pode ocorrer na guerra tanto por obra de soldados indisciplinados quanto como arma estratégica para humilhar e aterrorizar, como no caso das Forças Regulares de marroquinos que lutaram sob as ordens de Franco na Guerra Civil Espanhola.

Conforme o registro dos estupros foi aperfeiçoado, a escala do crime tornou-se mais visível . Com a Guerra da Bósnia, na década de 1990, reconheceu-se o uso sistemático do estupro como arma de guerra e da necessidade de puni-lo como crime hediondo. Com campanhas globais e a resolução oficial nesse sentido do Conselho de Segurança da ONU, em 2008, o mundo sensibilizou-se.

Teoricamente, as convenções de Genebra sobre tratamento dos civis durante a guerra são respeitadas por políticos e generais na maioria dos países civilizados. Mas no caos da guerra irregular, com exércitos privados ou milícias indisciplinadas, essas normas têm pouco peso.
A parte oriental do Congo tem sido caó­tica desde o genocídio em Ruanda, em 1994. Em 2008, o grupo humanitário Comitê de Resgate Internacional (IRC, em inglês) estimou que 5,4 milhões de pessoas­ já tinham morrido na “guerra mundial da África”. Apesar dos acordos de 2003 e 2008, a violência ainda não cessou.

Há muitos números sobre quantas mulheres foram violadas, nenhum conclusivo. Em outubro de 2010, Roger Meece, chefe das Nações Unidas no Congo, disse ao Conselho de Segurança da ONU que 15 mil mulheres tinham sido estupradas em todo o país em 2009 (os homens também sofrem, mas a maioria das vítimas é de mulheres). O Fundo para a População da ONU estimou 17,5 mil vítimas no mesmo período. O IRC diz que tratou 40 mil sobreviventes somente na província de Kivu Meridional, entre 2003 e 2008.

Hillary Margolis, que dirige o programa de violência sexual do IRC, diz que esse dado representa um piso. Os verdadeiros números podem ser muito maiores. Sofia Candeias, que coordena o projeto Acesso à Justiça do Programa de Desenvolvimento da ONU no Congo, diz que violações são mais relatadas em lugares com serviços de saúde. Onde a luta é mais acirrada, as mulheres podem ter de caminhar centenas de quilômetros antes de contarem a alguém que foram atacadas e, até lá, podem ter-se passado meses ou anos. Muitas vítimas são mortas pelos atacantes, ou morrem dos ferimentos causados. Muitas não relatam o estupro por causa do estigma.

Um estudo recente da Iniciativa Humanitária de Harvard e da Oxfam examinou sobreviventes no Hospital Panzi, em Bukavu, cidade de Kivu Setentrional. Com idades de 3 a 80 anos, solteiras, casadas ou viúvas, de todas as etnias, foram estupradas em casas, campos e florestas, na frente dos maridos e dos filhos; quase 60% violadas por grupos. Filhos foram obrigados a violar as mães ou seriam mortos.

O tabu que cerca o estupro é tão forte que poucos casos foram relatados pela história; evidências antes do século­ XX são escassas. Com um melhor registro, o mundo despertou para a escala do crime. Tornou-se visível o sequestro de mulheres como escravas sexuais, tortura e mutilação sexualizadas, estupro em público ou privadamente.

Não é só um problema africano. De 1980 a 2009, segundo Dara Kay Cohen, da Universidade de Minnesota, nos EUA, um terço das 28 guerras civis da África e metade das nove guerras na Europa Oriental tiveram altos níveis de estupro e nenhuma parte do mundo escapou à praga.

As condições da guerra são propícias: homens jovens e mal treinados, lutando longe de casa, livres das restrições sociais e religiosas. Para combatentes mal alimentados e remunerados, pode ser uma espécie de pagamento. Conforme as guerras passaram dos campos de batalha para as aldeias, mulheres e meninas ficaram mais vulneráveis. O front doméstico não existe mais; toda casa é a linha de frente."

Um comentário:

Anônimo disse...

Assunto espinhoso, terrível.
Mostra que a evolução humana ainda tem muito a percorrer.