22 de agosto de 2009

Dr. Nélio Artiles, infectologista e Diretor da Faculdade de Medicina de Campos escreve sobre a gripe suína:

"A epidemia da desinformação

Nélio Artiles Freitas

Vivenciamos um momento de grande apreensão em nosso planeta. De repente uma nova doença vinda de porco ameaça a população mundial. Seria o anunciado fim dos tempos? Existe uma tendência dos humanos de sempre imaginar ou prever o pior em qualquer situação nova. Pra piorar o contexto do medo e da insegurança do novo, numerosos especialistas em especulação e oportunistas lançam toneladas de informações desencontradas e sem nenhum embasamento científico em todo tipo de mídia, principalmente na rede mundial da internet.
Na verdade, esta não é uma doença nova. Hipócrates, o pai da Medicina, no século V antes de Cristo, relatou casos de uma doença respiratória que, em algumas semanas, matou muitas pessoas. O primeiro registro de pandemia de gripe ocorreu em 1889, com a morte de cerca de 300 mil pessoas. Já em 1918 a grande pandemia da Gripe Espanhola infectou 50% da população mundial e vitimou mais de 40 milhões de pessoas, sendo que no Brasil cerca de 65% da população foi infectada com mais de 35 mil mortes registradas. Depois veio a gripe asiática e a de Hong Kong e, recentemente, a gripe aviária. Porém anualmente enfrentamos epidemias da gripe sazonal que sempre foram subnotificadas e principalmente pouco valorizadas.
A mortalidade anual pela gripe sazonal atinge milhares de pessoas em todo o planeta principalmente entre idosos, crianças, portadores de doenças respiratórias, gestantes e outras condições que levam a uma baixa defesa imunológica, sendo que nunca foi motivo de mídia ou de preocupações. Mais recentemente, vários países instituíram a vacinação contra o vírus influenza com o intuito de reduzir os números de internações e mortes pela gripe entre idosos, o que demonstrou ser efetivo.
Mas o que tem de diferença real entre esta gripe suína, a gripe sazonal e as pandemias anteriores? Sabemos que é o mesmo vírus influenza, com diferenças apenas de algumas proteínas, mas com comportamentos semelhantes. As formas de transmissão, os sintomas e o grau de adoecimento são semelhantes. Mas algo tem nos chamado a atenção. A sua letalidade (mortalidade por grupos de pessoas com a doença) aparenta ser menor que todas as anteriores. Quando milhares de pessoas morreram ano passado (4 a 5 mil) pela gripe sazonal no Brasil, as atenções não estavam voltadas para o vírus influenza, mas este ano cada morte é alardeada de uma forma bem barulhenta. Em números absolutos, até 6 de agosto haviam sido registradas cerca de 1.500 mortes em todos os continentes. No Brasil, 384 segundo a última atualização.
Sinto-me na obrigação de chamar a sua atenção para o real posicionamento sobre esta gripe em nosso meio. O H1N1 irá continuar entre nós por muito tempo e não vão ser feriados escolares ou fugas da cidade que irão impedir que 30 a 40% de nossa população seja infectada, como nos conta seu perfil histórico. Outra informação importante é que mais de 95% das pessoas infectadas por este vírus irão melhorar espontaneamente, sem medicação, e os 5% restantes poderão complicar e deverão ser tratadas e acompanhadas pelos médicos. Em pandemias a faixa etária dos jovens é a mais acometida e por isto estamos vendo mais gestantes com formas graves, pois apresentam fatores de risco.
Como então evitar pegar esta gripe? Primeiro saber que o vírus fica vivo por alguns dias em superfícies, assim como nas mãos das pessoas e em roupas. Logo, a higienização das mãos é, sem dúvida, a forma mais importante de prevenir esta doença. A transmissão respiratória só ocorre em contatos íntimos ou quando alguém, a um metro de distância de você, solta gotículas em tosses ou espirros. Então o uso de máscaras só tem valor para os profissionais de saúde que irão examinar estes pacientes. Ou nas próprias pessoas que estão tossindo que, por uma questão de cidadania, deveriam usar máscaras comuns (cirúrgicas) para não disseminar o vírus em superfícies. O vírus não pula, não voa e nem fica no ar em suspensão.
A principal forma de prevenir esta doença é lembrar que nossas mãos são os grandes disseminadores do vírus e não o ar. A gripe H1N1 predomina entre nós, pois representa 75% das gripes que nos rodeiam no momento, de acordo com o Ministério da Saúde. Logo, sem pânico, vamos enfrentá-la com sobriedade e responsabilidade.
Qualquer gripe é perigosa (sempre foi) e temos que nos preparar para enfrentar esta e as outras que inevitavelmente aparecerão em nosso meio. Vamos viver uma vida responsável, cuidando de nossa saúde, do nosso corpo com uma boa alimentação, hidratação e uma regular atividade física aeróbica, associada ao reforço muscular e de alongamento. Se já está com gripe neste momento, não se assuste. Há 99% de chance de você melhorar sem nenhuma medicação. Mas caso esteja se sentindo mal, principalmente com falta de ar, febre alta e tosse, procure seu médico e evite ir a um pronto-atendimento hospitalar, pois as informações acima poucas pessoas têm e lotam os hospitais desnecessariamente. O seu médico irá avaliar se precisa ou não de algum remédio.
Precisamos voltar a nos preocupar com outras doenças que continuam a matar muito mais que a gripe como doenças cardiovasculares, acidentes de trânsito, neoplasias, desnutrição, diarréias em crianças, doenças pneumocócicas em crianças, entre muitas outras. Precisamos voltar a nos preocupar com a corrupção e a irresponsabilidade dos muitos governantes que comandam o destino deste país.
Vamos nos cuidar, brasileiros."

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