24 de outubro de 2010

Reminiscências em uma pequena crônica dominical ou: Sobre amoras, araçás e jabuticabas

Devo estar ficando velho. Não que pareça, já adianto. A genética e alguma atividade física têm me ajudado ao longo deste meio século mais 1 (mais 1 ano e não mais 1 século).

Essa percepção é despertada quando algum fato me dá uma espécie de nostalgia de tempos que não voltam (como diria o compositor).

Ou quando me pergunto: “cadê aquelas coisas legais que não existem mais?” ou “por onde andam aquelas pessoas que já estiveram tão presentes em minha vida?”.

Já me entenderão melhor.

Tive uma infância meio urbana meio rural (o que sempre me faz lembrar de um disco do saudoso músico Paulo Moura: “Confusão Urbana, Suburbana e Rural”, de 1976; não que eu tenha sido um jovem confuso, nem tenha participado de atos de ‘confusão’, embora eram tempos de ditadura, mas eu era uma criança).

Nasci e morei até os 12 anos na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, área que começa no final da Barra da Tijuca e avança até Santa Cruz, passando pelo Recreio, Jacarepaguá e Campo Grande. Longe, portanto, do ‘glamour’ da Zona Sul.

Em frente à minha casa havia uma imensa área livre, um sítio aberto a todos, com riacho, mangueiras, goiabeiras, coqueiros, pé de laranja lima (lembram do belo livro autobiográfico do José Mauro de Vasconcelos que depois foi transformado em filme e novela?), jamelão, tamarindo, campo de futebol e até bois criados soltos.

Pois recentemente estive em um desses estabelecimentos “hortifruti” e fiquei olhando a profusão de frutas ali disponibilizadas. Me aproximei das estantes que continham aqueles espécimes considerados mais “raros”, menos consumidos, para dar uma olhada no que havia por ali.

De repente percebi que eu não estava olhando por olhar e sim estava procurando algo. E eram três tipos de frutinhas.

Voltando ao túnel do tempo, em flashback: além do citado sítio, o quintal de minha casa era grande e havia ali também alguns pés de fruta. Tanto árvores, como arbustos.

Pois naquele momento, em frente às estantes, eu me vi outra vez em meu quintal, criança pequena, tirando direto do pé, amoras vermelhas e roxas, jabuticabas e araçás.

Não sei quantos que lêem esse texto aqui no blog conhecem essas frutas. Não cabe aqui descrevê-las, a não ser seus sabores agridoces, suas cores marcantes, seus perfumes inesquecíveis.

Pois há muito tempo não vejo nem saboreio essas delicadezas. Saíram de moda ou nunca frequentaram esses estabelecimentos? De qualquer maneira, pela fragilidade, não resistiriam muito tempo ao ritmo frenético e às distâncias da cidade grande.

Acho que elas estão lá, escondidas na roça, esperando quem sabe pela criança que já fui e que erroneamente teimo em nunca mais voltar a ser.

Na verdade, ao olhar aquelas estantes do hortifruti procurando amoras, araçás e jabuticabas eu estava procurando, além das frutas, a minha infância perdida.

Não encontrei nenhuma coisa nem outra. Estão muito distantes agora.

Quem sabe eu ainda encontre as frutas por aí. Pelo menos isso...

Bom domingo!


Uma trilha sonora para essa crônica:

Trecho da novela "O meu pé de laranja lima", baseado no livro citado:

8 comentários:

Maria Inês disse...

Emocionante, Marcos. Me fez lembrar da minha infância também, inclusive O meu pé de laranja lima.
Sobre as frutas, é mais fácil achar jabuticabas quando está na época. Já amora e araçá há tempos não vejo também.

Andre Pinto disse...

Professor,
Que legal essse seu relato. Realmente é uma lembrança de todos nós! quero lhe fazer um convite: A minha chácara em São João da Barra tem dois centenários pés de jabuticaba que estão em flor, além dos pés de araçá roxa e amoras. Quando estiver carregado, te avisarei e você poderá vir com a sua família e com o amigo Roberto Moraes, ok? Aproveitaremos para tomar um bom "Monte Velho" e conversarmos sobre as terras lusitanas!
Grande abraço
Andre Pinto.

Obs> no meu blog eu já postei matérias sobre as jabuticabeiras quase bicentenárias.

Andre Pinto disse...

Professor,
Acesse http://andreambiental.blogspot.com/2008/10/dois-ps-de-jabuticaba-completam-o.html

Vai gostar das "estórias" sobre os nossos pés de jabuticaba também.
Abraços
Andre Pinto

ALICE IN WONDERLAND disse...

Legal a escolha da música Vilarejo da Marisa Monte. Não conheço o livro, mas deve ser bom também.
É bom recordar a infância.
Interessante no trecho do filme é mostrar as crianças escolhendo cada uma a sua árvore de estimação.
Hoje escolheriam o celular de estimação.
Bjs.

João Carlos disse...

Aí Marcos:
A NOSSA JABUTICABA, HEIN? QUEM DIRIA...
Olha aí que interessante!!!
A jabuticaba, nossa pequena notável!!! Fruta 100% brasileira.
É dela que vamos falar.
Discreta no quintal de nossa casa, ela contém teores espantosos de substâncias protetoras do peito. Ganha até da uva, e provavelmente do vinho que é festejado no mundo inteiro por evitar infartos.
Você vai conhecer agora uma revelação científica, e das boas, que acaba de cair do pé.
Por Regina Pereira
A química Daniela Brotto Terci nem estava preocupada com as coisasque se passam com o coração. Tudo o que ela queria, em um laboratório da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no interior paulista, era encontrar na natureza pigmentos capazes de substituir os corantes artificiais usados na indústria alimentícia.
E, claro, quando se fala em cores a jabuticaba chama a atenção.
Roxa? Azulada? Cá entre nós, jabuticaba tem cor de... jabuticaba.
Mas o que tingiria a sua casca? A cientista quase deu um pulo para trás ao conferir: "enormes porções de antocianinas", foi a resposta.
Desculpe o palavrão, mas é como são chamadas aquelas substânciasque, sim, são pigmentos presentes nas uvas escuras e, conseqüentemente, no vinho tinto, apontados como grandes benfeitores das artérias.
Daniela jamais tinha suspeitado de que havia tanta antocianina ali, na jabuticaba, aliás, nem ela nem ninguém.
“Os trabalhos a respeito dessa fruta são muito escassos”, tenta justificar a pesquisadora, que também mediu a dosagem de antocianinas da amora.
Ironia, o fruto da videira saiu perdendo no ranking, enquanto o da jabuticabeira...

Dê só uma olhada (o número representa a quantidade de miligramas das benditas antocianinas por grama da fruta):
jabuticaba: 314
amora: 290
uva: 227
As antocianinas dão o tom. 'Se um fruto tem cor arroxeada é porque elas estão ali', entrega a nutricionista Karla Silva, da Universidade Estadual do Norte Fluminense, no Rio de Janeiro.
No reino vegetal, esse tingimento serve para atrair os pássaros
E isso é importante para espalhar as sementes e garantir a perpetuação da espécie', explica Daniela Terci, da Unicamp.

João Carlos disse...

Mais sobre Jabuticabas:
Para a Medicina, o interesse nas antocianinas é outro. “Elas têm uma potente ação antioxidante”, completa a pesquisadora de Campinas. Ou seja, uma vez em circulação, ajudam a varrer as moléculas instáveis de radicais livres. Esse efeito, observado em tubos de ensaio, dá uma pista para a gente compreender por que a incidência de tumores e problemas cardíacos é menor entre consumidores de alimentos ricos no pigmento.
Ultimamente surgem estudos apontando uma nova ligação: as tais substâncias antioxidantes também auxiliariam a estabilizar o açúcar no sangue dos diabéticos.
Se a maior concentração de antocianinas está na casca, não dá para você simplesmente cuspi-la. Tudo bem, engolir a capa preta também é difícil. A saída, sugerida pelos especialistas, é batê-la no preparo de sucos ou usá-la em geléias. A boa notícia é que altas temperaturas não degradam suas substâncias benéficas.
Os sucos, particularmente, rendem experiências bem coloridas. A nutricionista Solange Brazaca, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), em Piracicaba, interior paulista, dá lições que parecem saídas da alquimia. “Misturar a jabuticaba com o abacaxi resulta numa bebida azulada”, ensina. “Já algumas gotas de limão deixam o suco avermelhado”. As variações ocorrem devido a diferenças de pH e pela união de pigmentos ácidos.
Mas vale lembrar a velha máxima saudável: bateu, tomou. “Luz e oxigênio reagem com as moléculas protetoras”, diz a professora. Não é só a saúde que sai perdendo: o líquido fica com cor e sabor alterados.
Aliás, no caso da jabuticaba, há outro complicador. Delicada, a fruta se modifica assim que é arrancada da árvore. “Como tem muito açúcar, a fermentação acontece no mesmo dia da colheita”, conta a engenheira agrônoma Sarita Leonel, da Universidade Estadual Paulista, em Botucatu. A dica é guardá-la em saco plástico e na geladeira. Agora, para quem tem uma jabuticabeira, que privilégio!
A professora repete o que já diziam os nossos avós: “Jabuticaba se chupa no pé”.
O branco tem seu valor.
A bioquímica Edna Amante, do laboratório de frutas e hortaliças da Universidade Federal de Santa Catarina, destaca alguns nutrientes da parte branca e mais consumida da jabuticaba. “É na polpa que a gente encontra ferro, fósforo, vitamina C e boas doses de niacina, uma vitamina do complexo B que facilita a digestão e ainda nos ajuda a eliminar toxinas”.
Ufa! E não só nessa polpa, mas também na casca escura, você tem excelentes teores de pectina. “Essa fibra tem sido muito indicada para derrubar os níveis de colesterol, entre outras coisas”, conta a nutricionista Karla Silva. A pectina, portanto, faz uma excelente dobradinha com as antocianinas no fruto da jabuticabeira. Daí o discurso inflamado dessa especialista, fã de carteirinha: “A jabuticaba deveria ser mais valorizada, consumida e explorada”.
Nós concordamos, e você?
A jabuticabeira
Nativa do Brasil, ela costuma medir entre 6 e 9 metros e é conhecida desde o período do descobrimento. “A espécie é encontrada de norte a sul, desde o Pará até o Rio Grande do Sul”, diz o engenheiro agrônomo João Alexio Scarpare Filho, da ESALQ. Segundo ele, a palavra jabuticaba é tupi e quer dizer “fruto em botão”.

João Carlos disse...

A invenção é esta: vinho de jabuticaba. O nome não deixa de ser uma espécie de licença poética, já que só pode ser denominado vinho pra valer o que deriva das uvas. Mas, sim, existe um fermentado feito de jabuticaba que, aliás, já está sendo exportado.
“O concentrado da fruta passa um ano inteiro em barris de carvalho”, conta o farmacêutico-bioquímico Marcos Antônio Cândido, da Vinícola Jabuticabal, em Hidrolândia, Goiás.
A jabuticaba é a matéria-prima de delícias já conhecidas, como a geléia e o licor, e também de uma espécie de vinho. Quem provou a bebida garante: é uma delícia.
Em 100 gramas ou 1 copo:
Calorias 51
Vitamina C 12 mg
Niacina 2,50 mg
Ferro 1,90 mg
Fósforo 14 g
Tire proveito da jabuticaba
Atributos, para essa fruta tipicamente brasileira, são o que não faltam. Vitaminas, fibras e sais minerais aparecem nela ao montes.
Agora, para melhorar ainda mais esse perfil nutritivo, pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas descobriram que ela está cheia de antocianinas, substâncias que protegem o coração.
Mais uma razão para que a jabuticaba esteja sempre em seu cardápio.

Marcos Oliveira disse...

Obrigado a todos que comentaram.
Maria Inês: Estou pensando em reler esse livro.
Já me avisaram que jabuticaba é mais fácil de achar mesmo. Já amora e araçá...
André: O professor Luiz Felipe Muniz está um pouco afastado do blog por conta da necessidade de resolução de problemas mais urgentes. Em breve ele te responderá. Mas... pode mandar através dele as frutinhas pra mim! Em tempo: muito legal os posts em seu blog sobre as jabuticabeiras.
Alice: Acho que estás certa com relação às crianças de hoje. Árvores são quase alienígenas para jovens urbanos.
João Carlos: Valeu pela extensa matéria sobre os poderes da jabuticaba. Muitos motivos a mais para consumirmos a simpática fruta!
Abraços a todos.