Tatuagem

Luis Fernando Veríssimo é hoje quase uma unanimidade nacional entre aqueles que gostam de uma deliciosa leitura.

Sua mais recente crônica, publicada em diversos jornais do Brasil, fala da arte da tatuagem.

O motivo dele ter escolhido esse tema foi a 'tattoo' que a Cleo Pires fez no inicio da coxa, próximo ao quadril, de um poema atribuido a Fernando Pessoa, para a sessão de fotos da Playboy.

Já publicamos essa foto aqui, mas não custa nada repetir, né?

Como sempre, seu texto flui bem, com bom humor e algumas conclusões interessantes.

A tatuagem foi e continua sendo um modismo dos últimos dez anos, mas trata-se na verdade de uma arte e uma tradição milenar, que tem muitos significados em diversas culturas ancestrais.

Hoje, com a melhoria da qualidade dos equipamentos e materiais utilizados, aliado ao dons artísticos dos tatuadores, a beleza das tatuagems tem se destacado entre famosos e anônimos, ultrapassando a barreira 'marginal' que existia nas décadas de 1960 e 1970.

É claro que existem exageros, mas acho legal. Aliás, bom tema para os pesquisadores de plantão.

Segue a ótima crônica do LFV e algumas imagens que eu selecionei na rede.

"Li que a Cleo Pires mandou fazer a tatuagem de um verso do Fernando Pessoa num, se entendi bem, quadril, para ser fotografada para a “Playboy”.

A tatuagem é provisória, mas Cleo Pires pode muito bem estar inaugurando um novo espaço para a literatura.

Você não abriria mais a “Playboy” só para ver mulher nua, teria material de leitura na própria mulher nua. Um haikai em cada seio, Drummond e Bandeira nas nádegas, um resumo da “Odisseia” começando no pescoço, circundando o umbigo como se fosse a ilha de Calipso e desaparecendo no púbis, ou no retorno simbólico de Ulisses ao lar e ao aconchego de Penélope. Você poderia elogiar a artista pelada do mês, mas discutir a sua escolha de textos (“Kafka nas coxas?!”). E ter uma desculpa pronta ao ser flagrado espiando uma nua da “Playboy” escondido.— Nem notei a mulher. Eu estava lendo o autor novo no seu pé.

A tatuagem é a mais nova forma de arte do mundo — embora não tenha nada de novo. O próprio nome, “tatu”, vem da prática de perfuração da pele que o Capitão Cook já encontrou no Tahiti e em outras ilhas dos mares do Sul no Século 18. Na China antiga, o ideograma para tatuagem era “wen”, que queria dizer tanto escrita quanto sabedoria, e as palavras que cobriam um corpo humano eram uma espécie de prece permanente, ou uma maneira de manter contato com os poderes divinos depois de um processo de iniciação. Os tatuados pertenciam a uma irmandade exclusiva, o que não é o caso hoje, quando todos estão se tatuando, por nenhuma razão superior e nem sempre com muita sabedoria.Os casos mais evidentes de imprevidência tatuada são os nomes de amantes gravados sob corações entrelaçados, quando não havia dúvida que o amor seria eterno, e que precisam ser apagados quando o amor acaba. E imagino que atrizes e atores que cobrem seus corpos com tatuagens estejam conscientemente limitando a sua escolha de papéis. Adão e Eva, por exemplo, nem pensar, a não ser numa versão muito livre de Genêsis.Mas não deixa de ser fascinante esta nova forma de arte, feita não em papel ou tela – ou nas paredes, como o grafite, a outra forma de arte a que ela mais se assemelha –, mas na pele do corpo. Mistura de decoração, assertiva pessoal, autos-sacrifício e kitsch assumido. Arte feita com cicatrizes. Ou arte evanescente, como no caso da poesia no belo costado da Cleo Pires."